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    'Vale do Silício Amazônico' pode manter floresta em pé, diz estudo

    DA DEUTSCHE WELLE

    19/09/2016 11h25 - Atualizado às 14h56
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    Getty Images/C.Simon
    Pra proteger a floresta, cientistas propõem transformar a biodiversidade em tecnologia
    Para proteger a floresta, cientistas propõem transformar a biodiversidade em tecnologia

    A maior floresta tropical do planeta, a Amazônica, berço de pelo menos metade de todas as espécies vivas, pode se transformar no próximo "Vale do Silício".

    A proposta parte de cientistas: os 6,7 milhões de km2 de floresta –quase 19 vezes o tamanho da Alemanha–, escondem matérias-primas que devem impulsionar a quarta revolução industrial, diz um estudo publicado nesta semana na revista "Proceedings of the National Academy of Sciences", dos Estados Unidos.

    "As nossas análises mostraram que, se continuarmos com os dois modelos de desenvolvimento historicamente usados, que são a conservação pura da floresta e a atividade agropecuária, o desmatamento vai continuar. Se não encontrarmos uma outra maneira, a floresta vai desaparecer", afirma em entrevista o climatologista Carlos Nobre, principal autor do estudo e recém-eleito membro da Academia Nacional de Ciências dos Estados Unidos.

    Chamada de "terceira via", a proposta dos cientistas enxerga a Amazônia como um patrimônio biológico global, que pode impulsionar a nova revolução movida a inteligência artificial e tecnologias que "imitam" a natureza –o biomimetismo.

    "Estamos dizendo que existe um valor agregado muito maior nos recursos biológicos da Amazônia que podem gerar uma economia muito robusta, de longo prazo, que sustentará um novo modelo e que é compatível com a floresta em pé", explica Nobre.

    Desvendar de que plantas e animais são feitos, como organismos se locomovem e percebem o ambiente, por exemplo, são a chave para criação de materiais, sensores e até robôs do futuro.

    "Conhecemos o caso de uma espuma resistente produzida por um sapo que inspirou a criação de uma nova tecnologia de captura de CO2 da atmosfera", diz Juan Carlos Castilla-Rubio, um dos autores e presidente do conselho da Space Time Ventures, incubadora de start-ups de tecnologia.

    Imago/Fotoarena
    O climatologista Carlos Nobre é o principal autor do estudo
    O climatologista Carlos Nobre é o principal autor do estudo

    HISTÓRICO DE DESTRUIÇÃO

    Em mais de 50 anos de exploração da Amazônia, que se estende por 9 países e ocupa 47% do território brasileiro, a expansão da agropecuária e ocupação já desmataram 20% da floresta. Segundo diversos estudos publicados por climatologistas, se mais de 40% da floresta for destruída, a mata densa não consegue mais se recuperar e se transforma numa savana.

    A Amazônia também é fundamental no combate às mudanças climáticas –a estimativa é que suas árvores armazenem até 200 bilhões de toneladas de carbono. A liberação desse gás de efeito estufa na atmosfera poderia elevar a temperatura do planeta num ritmo ainda mais acelerado.

    "Talvez a proposta de explorar esse patrimônio biológico seja, de fato, a única possibilidade de conservar a Amazônia", avalia Nurit Bensusan, especialista em biodiversidade do Instituto Socioambiental (ISA). "Mas é preciso muito cuidado para que haja a repartição de benefícios, para que a exploração dos recursos naturais não vire patentes nas mãos de empresas internacionais detentoras de tecnologia", alerta.

    "VALE DO SILÍCIO" AMAZÔNICO

    Para Castilla-Rubio, a Amazônia é o próximo centro de inovações do mundo, mas ainda é cedo para dizer se a floresta tropical será tomada por laboratórios de alta tecnologia.

    "Ainda não sabemos como isso vai acontecer exatamente, é um tema que vai durar 20 anos ou mais. Mas sabemos que a capacidade e conhecimento local precisam ser reforçados, e muito", comenta Castilla-Rubio, que compara o nível de dificuldade do projeto "à ida do homem à Lua".

    Atualmente, apenas 2% dos doutores formados anualmente no Brasil vêm de universidade amazônicas. Ao mesmo tempo, a Amazônia é o lar de cerca de 2,7 milhões de indígenas. Para que essas comunidades se beneficiem do "Vale do Silício Amazônico", a pesquisadora Bensusan diz que é preciso reverter uma tendência.

    "Caminhamos para uma situação em que os conhecimentos tradicionais estão sendo desrespeitados. É preciso fazer um reconhecimento do importante papel que eles desempenham, não só identificando determinados princípios, mas também usando plantas e animais para processos de cura e cosméticos, fazendo a distribuição espacial de muitas espécies, e o manejo", critica Bensusan.

    Nobre reconhece as dificuldades. "É difícil essa articulação do que realmente retorna para os povos da floresta quando o conhecimento deles é apropriado e se torna um produto no mercado. Mas a Lei da Biodiversidade está aí para ser testada", diz o cientista, fazendo referência à legislação aprovada em 2015, que prevê pagamento às comunidades indígenas por parte da indústria.

    É por isso que a revolução impulsionada pela Amazônia tem que ser inclusiva, defende Nobre. "E a única maneira de isso acontecer é pela qualidade da educação. E não dá para eliminar o governo: é ele que tem que garantir capacitação profissional e pesquisa básica. A revolução vai acontecer, queremos que ela traga o melhor impacto e benefício para a floresta e quem vive dela", finaliza.

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