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    Doria terá de vencer desconfiança e cumprir promessas extravagantes

    EDUARDO SCOLESE
    EDITOR DE "COTIDIANO"

    18/12/2016 02h00

    João Doria contou até aqui com o imponderável. Desde que decidiu disputar a Prefeitura de São Paulo, sempre fora das previsões, atropelou favoritos nas prévias do PSDB e conquistou a eleição ainda no primeiro turno, em disputa contra o atual prefeito e duas ex-prefeitas.

    A partir de 1º janeiro, quando pisar no gabinete do edifício Matarazzo, terá de vencer a desconfiança de seus próprios auxiliares e cumprir dentro do prazo algumas das extravagantes promessas.

    Tarefa nada fácil, já que as principais propostas eleitorais foram tiradas da cartola sem um respaldo técnico de campanha transparente, e o gestor Doria ainda nem conheceu a vida real da máquina municipal e como é duro lidar com servidores que nem podem ser demitidos.

    De volta às promessas. Ao longo de 2017, Doria promete zerar duas filas históricas da cidade: a de exames (são mais de 400 mil pessoas à espera de atendimento médico) e a de vagas em creches (133 mil crianças de até 3 anos no aguardo da matrícula).

    Para cumprir a primeira delas, o tucano aposta tudo em um novo programa, sob o nome de "Corujão da Saúde". A ideia é que ao menos 40 hospitais privados, por meio de convênios com a prefeitura, abram suas portas para a realização de exames em horários ociosos de atendimento, como finais de tarde e inícios de noite. Essa força-tarefa, em 90 dias, zeraria a fila dos exames.

    Para a segunda promessa, terá de colocar à prova toda a propagandeada fama de bom gestor e implementar o equivalente a mil creches em um ano, proeza nunca alcançada por nenhum de seus antecessores. Para incluir todas as crianças em 2017, terá que abrir, em média, quase três creches por dia na cidade. Até o futuro secretário de Educação desconversa sobre essa meta.

    Promessas ousadas, e orçamento ainda mais enxuto por culpa do próprio novo prefeito. Em uma atitude intempestiva no dia seguinte à vitória nas urnas, Doria prometeu congelar a tarifa de ônibus em R$ 3,80 ao longo de todo o ano de 2017. Isso terá um preço: um prejuízo de R$ 1,2 bilhão a ser retirado do orçamento da cidade e entregue aos empresários de ônibus, valor esse suficiente para construir 30 km de corredores de ônibus, por exemplo.

    O início da gestão será turbulento. Em suas primeiras semanas, além de ver a cidade castigada pelas tradicionais enchentes, Doria enfrentará uma já esperada onda de ocupações de sem-teto e terá de torcer para que o aumento da velocidade nas marginais Tietê e Pinheiros, outra promessa, não engrosse as estatísticas de mortes no trânsito.

    O imponderável que o ajudou na campanha também pode ser um obstáculo no meio do mandato. Haddad sentiu isso na pele algumas vezes durante sua gestão, como na decisão judicial que congelou o reajuste do IPTU e secou ainda mais o caixa municipal.

    Doria chega com pique e sem vícios. Dorme pouco, tem disposição de ir para a rua, é aliado do governador e do presidente, possuirá uma ampla base aliada na Câmara Municipal e conseguiu montar um bom time de secretários. São importantes vantagens.

    O problema é que São Paulo é quase ingovernável. Enchentes, favelas que só crescem, trânsito pesado, saúde e educação limitadas e cracolândias espalhadas. O empresário que conheceu a cidade na campanha terá de acelerar na largada. A reputação do gestor é que estará em jogo.

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