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    Cometa visitado por sonda é tão pouco denso que flutuaria no mar

    SALVADOR NOGUEIRA
    COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

    22/01/2015 22h27

    A aventura começa a virar ciência, na primeira bateria de artigos científicos baseada nos dados da missão espacial europeia Rosetta, a primeira na história a pousar em um cometa, em novembro.

    Oito trabalhos publicados ontem na revista científica "Science" apresentam a mais completa análise já feita de um objeto desse tipo.

    O "raio-X" foi obtido entre agosto e setembro do ano passado, quando a sonda chegou ao cometa 67P/Churyumov-Gerasimenko e se estabeleceu em órbita dele.

    Os trabalhos ainda não contemplam a etapa mais emocionante da missão, quando o módulo Philae pousou com sucesso –e um bocado de sorte– na superfície do astro. Ainda assim, são de longe a mais rica coleção de informações já obtida de um cometa.

    Os resultados da Rosetta confirmam a imagem geral que os cientistas já tinham desses objetos –basicamente bolas de gelo misturadas com rochas e compostos orgânicos, formadas na mesma época em que surgiram os planetas, 4,6 bilhões de anos atrás.

    Contudo, uma das coisas que surpreenderam foi a completa ausência de grandes áreas de gelo exposto. A superfície inteira parece recoberta por grãos de poeira feitos de compostos orgânicos.

    Os cientistas descobriram ainda que o cometa é menos denso do que uma rolha. Assim, se o astro, um bloco de 4 km de largura, fosse jogado no mar, flutuaria.

    Um dos instrumentos da Rosetta descobriu que essa baixa densidade se deve ao interior poroso –são pequenas cavidades, como em uma esponja, em vez de uma única grande área aberta.

    A baixa massa faz com que a gravidade do cometa seja fraca. Os cientistas descobriram que ele tem um cânion de 900 metros de altura, mas o surpreendente é que seria possível para um humano pular nesse buraco e cair suavemente no fundo.

    O físico Rhett Allain, aliás, calculou que seria possível soltar um astronauta de uma nave que estivesse apenas sobrevoando o cometa. Ele desceria vagarosamente até o solo e "pousaria" sem se machucar. Além disso, um pulo mais forte poderia ser o suficiente para fazê-lo subir novamente até a nave.

    Editoria de Arte/Folhapress

    FORMATO

    Editoria de Arte/Folhapress

    Outro aspecto curioso do Churyumov-Gerasimenko é que, à primeira vista, ele parece composto por dois corpos diferentes, grudados.

    São dois lóbulos, um maior (4,1 km de largura) e outro menor (2,5 km), colados por um "pescoço". A dúvida dos cientistas é: são dois objetos que se encostaram e se tornaram um, ou é um só, e o formato bizarro se dá pelo desgaste maior na região do pescoço, pela evaporação de gelo?

    Até agora, ainda não foi possível determinar isso. "Ambas hipóteses permanecem válidas. Só observações podem excluir uma delas", diz Holger Sierks, líder da equipe que controla as câmeras Osiris, principal sistema de imageamento da Rosetta.

    Os cientistas buscam encontrar diferenças de composição ou densidade entre os dois lóbulos, evidência de que são dois pedaços distintos. "Até agora, eles se mostraram muito parecidos", diz Sierks.

    RUMO AO SOL

    Ao "escoltar" o cometa até as redondezas do Sol, a missão Rosetta poderá observar todas as transformações que ocorrem na superfície conforme a viagem acontece.

    O encontro entre os dois aconteceu a 3,7 unidades astronômicas de distância do Sol –uma unidade astronômica representa a distância da nossa estrela-mãe à Terra. É uma região bem fria do sistema, além da chamada "linha de neve", que marca a fronteira a partir da qual a água se comporta como rocha sólida no espaço.

    Conforme ele avança em sua órbita elíptica, essa distância vem diminuindo. Em maio, ele atingirá o periélio –o ponto de máxima aproximação com o Sol. Na ocasião, ele estará a 1,2 unidades astronômicas do astro-rei, quase a mesma distância que a Terra.

    Ao cruzar a linha de neve, mais e mais gelo começa a evaporar, o que produz a cauda pronunciada dos cometas.

    Essa evaporação vai permitir acesso a materiais mais profundos do cometa, que remontam aos primórdios da sua formação. "Isso será incrível. Esperamos enormes mudanças", disse à Folha Holger Sierks, líder da equipe que controla as câmeras Osiris, principal sistema de imageamento da Rosetta.

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