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    Mel que chega da China é investigado na alfândega norte-americana

    DO "NEW YORK TIMES"

    31/01/2015 02h03

    Três frascos cheios de uma substância pegajosa e amarelada estão guardados no laboratório da Alfândega dos EUA. É mel, ou pelo menos assim alega o importador.

    A tarefa dos técnicos: determinar se as amostras foram adulteradas com adoçantes ou xaropes e, caso a maior parte seja mel, descobrir de onde ele veio. Se o mel for da China, como é o caso frequentemente, todo o carregamento pode estar sujeito a sobretaxas.

    O mel, um dos focos deste laboratório, é o protagonista de um antigo golpe alimentar– conhecido como lavagem do mel–, que desafia a tecnologia forense existente.

    Cerca de 70% do mel consumido nos EUA é importado. Em 2001, o Departamento de Comércio adotou uma rigorosa alíquota de importação sobre o mel chinês, depois que produtores americanos se queixaram de que os chineses estariam praticando "dumping" dos seus produtos no mercado.

    Em seguida, as importações de mel de outros países dispararam, inclusive de nações que não são conhecidas por terem grandes populações de abelhas.

    De acordo com a Associação Americana dos Produtores de Mel, os apicultores malasianos, por exemplo, têm capacidade para produzir 20 toneladas de mel por ano, mas o país exportou 17 mil toneladas do produto para os EUA.

    O mel chinês, originalmente embarcado em portos como os de Xangai ou Pusan (Coreia do Sul), ganhou rótulos de outros países.

    Para estancar o contrabando, os químicos daqui testaram milhares de amostras recolhidas em portos do sudeste dos EUA.

    Em 2008, o laboratório demonstrou com cerca de 90% de certeza que o produto importado da Tailândia, das Filipinas e da Rússia era na verdade oriundo da China.

    Os químicos Robert Redmond e Christopher Kana, funcionários do laboratório, recentemente colheram uma amostra de mel e puseram um ácido que o digere. O resultado parecia água barrenta.

    Nos últimos anos, os cientistas vêm demonstrando que variações químicas sutis em muitos alimentos -indetectáveis ao paladar ou a olho nu-, podem oferecer indícios consistentes sobre seu local de origem. O trabalho analítico do laboratório depende desses "rastreadores" geográficos.

    Depois que uma amostra é diluída, o líquido é injetado em um espectrômetro de massa. Lá dentro, um nebulizador transforma a amostra em uma névoa fina sobre argônio aquecido, um processo que produz uma "assinatura" peculiar de elementos presentes em quantidades ínfimas.

    O espectrômetro pode medir a presença de cromo, ferro, cobre e outros elementos até o nível de algumas partes por quatrilhão.

    Cada combinação reflete a composição dos solos -os elementos foram recolhidos por plantas que alimentaram as abelhas.

    Os solos variam de região para região e, comparando estatisticamente a presença de cerca de 40 elementos diferentes com relação a um banco de dados de referência, os cientistas da agência alfandegária podem verificar as prováveis origens das amostras.

    Inicialmente, a identificação do mel contrabandeado dependia de um teste que detectava um antibiótico não aprovado, o cloranfenicol, descoberto no mel chinês.

    Carson Watts, ex-diretor do laboratório, disse que os chineses pararam de usar esse produto quando "a notícia se espalhou".

    Por volta de 2006, alguns importadores pareciam "batizar" o mel com xarope de frutose de arroz, ou disfarçar mel puro e barato como sendo uma mistura artificial (na época, o imposto de importação era aplicado a misturas artificiais que contivessem mais de 50% do seu peso em mel).

    O problema é que é quase impossível para a Alfândega determinar de forma confiável a proporção entre xarope de arroz e mel.

    Em 2011, o governo acusou três empresas de importarem milhões de dólares em mistura de xarope de arroz que, na verdade, era basicamente mel. Os importadores disseram que o produto continha menos de 50% de mel.

    Os cientistas em Savannah apresentaram provas de que a abundância de pólen nas misturas indicava o mel como principal ingrediente do composto. Mas os advogados de defesa contestaram a pesquisa em termos científicos. O processo foi arquivado.

    A análise química mais sofisticada pode ter seus limites. Mas, por enquanto, os detetives alimentares não se detêm. "Se é mel da Malásia", disse Redmond, "testamos para ver se é da China".

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