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    Bichos são capazes de fazer mímica e até mentir o sotaque, dizem estudos

    GABRIEL ALVES
    DE SÃO PAULO

    08/03/2015 01h45

    Uma rã de 5 cm bate com o pé no chão. A mais de 5 metros de distância, uma outra recebe a mensagem. A espécie Leptodactylus albilabris, que vive em Porto Rico, consegue se comunicar por mínimas vibrações no solo.

    É como se uma pessoa batesse o pé e outra, a mais de 150 metros, quase dois quarteirões de distância, pudesse identificar a "mensagem" pela tremedeira no chão.

    Editoria de Arte/Folhapress

    Maneiras assim estranhas de comunicação tem sido encontradas no reino animal. Os cientistas têm de ser criativos para interpretar os sinais, que servem para achar parceiros sexuais, assustar inimigos ou avisar sobre algum perigo.

    O zoólogo da Unicamp Luís Felipe Toledo, por exemplo, tenta entender como uma perereca supostamente muda da mata atlântica, a Bokermannohyla izecksohni, faz para não ficar isolada. Uma estratégia é mostrar um espelho para os machos, fazendo com que eles acreditem que há outro no local. Os animais começam a fazer gestos agressivos –trata-se de uma perereca mímica.

    Luís Felipe Toledo
    Pesquisador usa espelho para ver se _Bokermannohyla izecksohni_, perereca provavelmente muda, se comunica por gestos
    Espelho é usado para ver se a perereca muda Bokermannohyla izecksohni se comunica por gestos

    Animais maiores também são estudados. Simon Townsend, da Universidade de Zurique, é especialista em ouvir (e gravar) grunhidos de chimpanzés. Ele pacientemente escutou grupos de animais que viviam separadamente na Holanda e na Escócia. Townsend primeiro descobriu qual "palavra" cada um utilizava para designar maçã. Os cientistas então juntaram os animais e perceberam que, após uma convivência de três anos, eles aprenderam a falar o nome da fruta também no dialeto dos novos amigos.

    Provar que macacos aprendem vocábulos foi importante: nunca ninguém tinha demonstrado que um animal fosse capaz de aumentar seu repertório de palavras via interações sociais. Ponto para a equipe de Townsend, cujo trabalho foi publicado na "Current Biology" em fevereiro.

    À Folha, ele disse que ainda falta descobrir se o que animais fazem é como aprender um novo idioma ou se estamos tratando apenas uma mudança de sotaque.

    Não seria o primeiro caso de bichos com sotaque.

    NÃO GORJEIAM COMO LÁ

    Cientistas já viram que o beija-flor da cidade e do campo canta e "conversa" em tons diferentes. Na cidade, o gorjeio é mais agudo. Em um tom mais alto, os efeitos do eco nos edifícios é reduzido.

    Segundo o zoólogo da USP Eduardo Santos, entre 10 e 20 km já são suficientes para mudar o dialeto das aves.

    Algo parecido ocorre com as vacas, que mugem com "sotaque" diferentes.

    Mas malandro é o filhote de cuco. Cucos são conhecidos por parasitar o ninho alheio –a mãe põe o ovo entre o de outras espécies. Quando o cuquinho nasce, logo começa a imitar o "idioma" da espécie parasitada. Se não fizer isso, a mãe postiça percebe, e ele é enxotado dali para a morte.

    Gregory 'Slobirdr' Smith/Flickr
    Golfinhos fotografados próximos às ilhas Galápagos; animais podem ter um assobio para cada um, que funciona como nome
    Golfinhos podem ter um 'assobio' diferente associado a cada indivíduo, ao qual respondem imitando-o

    Outro bicho verbal é o golfinho. Cada indivíduo é associado a um assobio, que funciona como nome. Quando o golfinho escuta seu nome, ele o repete, como se estivesse dizendo "este sou eu, oi!".

    E veja só: como os humanos, golfinhos nem sempre respondem. Pois é, o "visualizado e não respondido" não é coisa só da nossa espécie...

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