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    Tetraplégico mexe braço robótico com o poder da mente

    GABRIEL ALVES
    DE SÃO PAULO

    22/05/2015 02h03

    Depois de mais de uma década, finalmente o americano Erik Sorto, 32, pode tomar uma cerveja sem ajuda de ninguém.

    Ele era membro de uma gangue em Los Angeles, e um tiro o deixou tetraplégico aos 21 de idade, após uma emboscada em que morreu um amigo.

    Durante os últimos meses, ele foi voluntário de um projeto de pesquisa que utilizou chips implantados no cérebro com a finalidade de controlar os movimentos de um braço robótico.Os resultados são promissores.

    Spencer Kellis e Christian Klaes/Caltech
    Erik Sorto, 32, que depois de ser baleado, ficou tetraplégico. Ele participou de um estudo, publicado em 21.mai.2015 na 'Science' para controlar um braço robótico apenas com o 'poder da imaginação
    Erik Sorto, que foi baleado e ficou tetraplégico. Ele controlou um braço-robô com o 'poder da imaginação'

    "Foi fantástico. Eu estava esperando por 13 anos para poder tomar uma cerveja sem ajuda. Não sei se as pessoas conseguem entender o que isso significa. Eu sempre tinha que ficar pedindo para os outros", afirmou ele.

    A pesquisa, publicada na edição desta semana da revista científica "Science", teve a participação de institutos de pesquisa da Califórnia e do centro nacional de reabilitação "Racho Los Amigos", todos nos EUA.

    William Mur/Editoria de Arte/Folhapress
    Braço biônico movimentado por tetraplégico

    Sorto já conseguiu, por exemplo, jogar jankenpon (pedra, papel e tesoura), realizar apertos de mão e manusear um liquidificador.

    Apesar de parecerem simples, essas tarefas exigem diversos movimentos combinados, com a contração e relaxamentos de vários músculos para serem executadas.

    O problema, segundo os cientistas, é que em geral as pesquisas focam em uma área do cérebro chamada de córtex motor primário, responsável pela execução dos movimentos.

    O movimento conseguido com o implante de um chip nessa região é "engasgado", brusco e difícil. É como se, para tomar um copo d'água, tivéssemos que pensar em como mexer o ombro, o braço, a mão e os dedos –tudo ao mesmo tempo.

    Nesse caso, quando se concentra em mexer os dedos, o movimento do ombro para ou retrocede, por exemplo.

    Daí a dificuldade para se cumprir uma tarefa que normalmente seria simples. A proposta dos cientistas foi a de explorar uma outra área do cérebro, o córtex parietal posterior, geralmente relacionado ao planejamento do movimento, e não à sua execução.

    Por exemplo, quando Sorto pensa "quero um copo d'água", seu cérebro organiza as ações (e disparos elétricos de neurônios) que realizariam o movimento. O computador processa essa intenção e comanda o braço robótico para executar a ação.

    Sorto diz não ter tido dificuldades para se adaptar ao braço robótico: "Fiquei surpreso de quão fácil era. Eu queria sair correndo por aí e fazer um high-five com todo mundo".

    "Foi uma grande surpresa que o paciente tenha conseguido controlar o braço robótico no primeiro dia em que ele tentou", diz Richard Andersen, pesquisador do Instituto de Tecnologia da Califórnia que coordenou estudo.

    "É impressionante porque ele não pode se mover, mas sempre conseguiu imaginar-se movendo. Então pudemos no basear nessa imaginação."

    O Brasil ainda está bem atrás dos EUA no que diz respeito ao estudo interface cérebro-máquina, de acordo com o neurocientista da USP Koichi Sameshima.

    Trabalhando na Universidade Duke, nos Estados Unidos, o brasileiro Miguel Nicolelis é um dos principais pesquisadores nessa área.

    O cientista brasileiro tinha como objetivo fazer um jovem se levantar de uma cadeira de rodas, andar e chutar uma bola na abertura da Copa de 2014 –o objetivo foi apenas parcialmente atingido.

    Nicolelis era um entusiasta do implante cerebral, tal qual os utilizados na pesquisa conduzida por Andersen, mas acabou optando por uma técnica mais simples na Copa. Procurado pela Folha, Nicolelis não comentou a pesquisa californiana.

    Veja o vídeo de quando Erik Sorto, pela primeira vez em 13 anos, conseguiu tomar uma bebida por conta própria:

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