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    Resistência de corais a águas quentes é transmitida de mãe para filho

    GABRIELA MALTA
    DE SÃO PAULO

    26/06/2015 02h01

    A resistência de algumas espécies de corais a águas mais quentes vem de berço, segundo um novo estudo de cientistas das universidades do Texas, do Estado do Oregon (EUA) e do Instituto de Ciência Marinha da Austrália.

    Os pesquisadores acabam de descobrir os mecanismos biológicos que estão por trás dessa tolerância e apontam que ela é transmissível aos descendentes.

    Essa proteção contra o calor pode, inclusive, ser usada no combate à extinção de corais, que são afetados pelo aquecimento global e pela acidificação dos oceanos.

    Os pesquisadores cruzaram indivíduos da espécie de coral Acropora millepora que viviam em diferentes regiões da Austrália: Baía Princesa Charlotte e Ilha Orpheus. A diferença de temperatura entre as duas regiões é de mais ou menos 2ºC.

    As larvas desses cruzamentos foram então colocadas em temperatura de 35,5ºC –esse tipo de organismo costuma aguentar até 32ºC– por um período de 27 a 31 horas.

    O resultado: as larvas descendentes de pais que viviam em regiões mais quentes tiveram dez vezes mais chances de sobreviver do que aquelas cujos pais viviam em regiões mais frias.

    O artigo publicado nesta quinta (25) na revista "Science" aponta que a tolerância das larvas estava relacionada a alterações nas mitocôndrias, organelas celulares que são transmitidas à prole somente pela mãe.

    "Essa é uma descoberta importante porque demonstrou que a tolerância pode ser transmitida de uma geração para a próxima. Ou seja, não é necessário esperar por novas mutações genéticas, que podem demorar muito para aparecer", afirma Miguel Mies, pesquisador do Instituto Oceanográfico da USP.

    Com a descoberta, os cientistas esperam poder escolher corais mais resistentes ao calor para a propagação artificial, para que elas possam naturalmente repovoar outros recifes em perigo.

    "A descoberta abre a possibilidade de aumentar rapidamente a tolerância das populações vulneráveis. Isso já acontece naturalmente, mas pode ser reforçado por seres humanos", disse por e-mail à Folha Line Bay, uma das autoras do artigo.

    "Acho que o transplante de corais pode ser uma solução viável para prevenir a extinção, muito mais viável do que a criação em cativeiro, como alguns propõem", disse por e-mail Mikhail Matz, um dos autores do artigo.

    Apesar de poder ser eficaz, a proposta dos pesquisadores não é tão fácil de ser posta em prática.

    "Quando você transporta animais de diferentes regiões, acaba levando junto outros organismos associados. É uma das situações que devem ser estudadas", afirmou Mies.
    Bay afirmou ainda que isso o deve ser apoiado em mais evidências científicas antes de ser aplicado em sistemas naturais.

    A elevação das temperaturas dos oceanos provoca alterações químicas nos corais que acabam expulsando outros organismos chamados zooxantelas.

    Corais e zooxantelas vivem em simbiose. Esses organismos fornecem parte da energia que os corais produzem via fotossíntese. Sem eles, os corais não resistem e acabam morrendo.

    A acidificação dos oceanos, outro resultado das elevadas emissões de carbono, também coloca os corais em perigo.

    Interações da água do oceano com o CO2 diminuem a disponibilidade de íons carbonato –uma das matérias primas dos esqueletos– dos oceanos. "Retirando a matéria básica para a síntese de seu esqueleto, os corais acabam ficando mais frágeis", explica Mies.

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