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    Avião de MG atinge 521 km/h e bate recorde mundial para naves pequenas

    MARIANA BARBOSA
    COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

    09/09/2015 02h00

    Raphael Brescia
    Avião Anaquim atinge 521 km/h e bateu recorde mundial para aeronaves pequenas
    Avião Anaquim pesa 330 quilos e foi projetado por estudantes da UFMG

    Foram cinco anos de trabalho. Cerca de 30 alunos se envolveram de alguma forma no projeto, seja projetando, fazendo cálculos ou lixando. Alguns aproveitaram o projeto como tema para tese de mestrado ou trabalho de graduação. Outros só queriam participar.

    No dia 21 de agosto, na base aérea de Santa Cruz, no Rio de Janeiro, o avião esportivo Anequim bateu cinco recordes mundiais de velocidade entre aviões de até 500 quilos, atingindo a marca dos 521 km/h.

    O avião tem 330 quilos e foi projetado por estudantes da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), sob a supervisão do professor de engenharia aeronáutica da UFMG Paulo Henriques Iscold, de 39 anos.

    O avião deixou para trás o americano Neemesis DR 90, desde os anos 1990 considerado o mais bem sucedido avião da história das competições aéreas e que está em exibição permanente no National Air and Space Museum, do Instituto Smithsonian, em Washington.

    CARBONO

    Assim como na competição automobilística, os aviões utilizados em disputas assim produzem inovações que posteriormente são incorporadas à indústria.

    O Anequim, cujo nome remete a uma feroz espécie de tubarão, foi o primeiro avião nacional construído 100% com fibra de carbono. Em termos de aerodinâmica, o desafio foi produzir um avião ultra leve, mas com uma rigidez capaz de suportar altas velocidades.

    Leve e com uma enorme rigidez, o avião mineiro possui uma aerodinâmica altamente eficiente e que permite atingir uma velocidade similar a de um jato como o Phenom, da Embraer, ao nível do mar, embora tenha apenas um motor simples, a pistão. (O mesmo não vale para altitude de cruzeiro, quando o jato, obviamente, tem performance superior.)

    "Como estamos longe de São José dos Campos [sede da Embraer e polo da indústria aeronáutica], projetar aviões com os alunos é uma forma de pôr a mão na massa, de sair da bolha da universidade", diz Iscold.

    "Na universidade, os alunos tem a vantagem de poder falhar quantas vezes quiserem. E a gente exercita junto com eles uma coisa que a gente não ensina na sala de aula: criatividade, empreendedorismo, responsabilidade técnica. A vida do piloto depende de cada parafusinho", diz Iscold, que também é engenheiro da equipe do piloto Paul Bonhomme na Red Bull Air Race, competição patrocinada pela marca de energéticos.

    Um dos alunos mais envolvidos com o projeto foi André Goldenstein, 23, aluno do nono semestre de engenharia aeronáutica. Ele também é piloto, assim como o seu pai.

    "No começo eu não entendi direito, nunca tinha visto universidade colocar recorde como objetivo", diz ele. "Hoje vejo como uma forma de validação. E algo que nos leva a querer fazer melhor cada detalhe, cada milímetro do acabamento."

    DINHEIRO

    O Anequim é o décimo avião projetado na universidade federal mineira. São mobilizadas pessoas em projetos que vão do design à fabricação, além da resistência dos materiais.

    Sem lei de incentivo ou qualquer outro dinheiro público além do uso das instalações da universidade, o Anequim foi bancado por entusiastas, que contribuíram com dinheiro, materiais e peças.

    O principal financiador do avião foi o piloto do Anequim, Gunar Armin Halboth, ex-Varig e campeão brasileiro de acrobacia aérea e que hoje pilota helicópteros e aviões particulares.

    Nem Halboth nem Iscold dizem quanto o projeto inteiro custou.

    "Não tem como colocar um preço nas horas dedicadas por um engenheiro como o Iscold e seus alunos", diz Halboth. "A maior parte do investimento foi minha, mas o Iscold gastou também. Eu guardo todas as notas, está tudo declarado. Mas prefiro não somar."

    "O projeto serve de exemplo para mostrar que não pode ficar só reclamando de Brasília. Você tem que arregaçar as mangas", diz Iscold, o professor da UFMG.

    SEM BAGAGEM

    Halboth e Iscold se conheceram há dez anos, quando o primeiro estava com um problema em uma asa de seu avião acrobático. Iscold encontrou uma solução e ficaram amigos.

    Halboth ajudou Iscold a retomar o projeto de uma aeronave anterior, que havia sido danificada num incidente, doando um motor usado.

    Acabou se transformando no piloto Anequim, o que fez de Halboth o único brasileiro com recordes mundiais homologados pela FAI (Federação Aeronáutica Internacional) desde o pioneiro Santos Dumont.

    O Anequim foi criado para bater recorde. Mas também serve como um meio de transporte. "Devo deixá-lo em Jundiaí ou Campinas, mas quero usar para ir para Belo Horizonte. Posso ir em menos de uma hora, na velocidade de um jato", afirma Halboth.

    Sem bagageiro nem conforto, terá de fazer um bate e volta. "No máximo consigo levar uma escova de dente no bolso", diz Halboth, 1,76 metro e 71 quilos, que emagreceu quatro quilos para conseguir bater os recordes com o Anequim –o peso do piloto conta–, correndo de 12 km a 16 km por dia.

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