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    Extinta na natureza, subespécie de cavalo selvagem volta a habitat

    RICARDO MIOTO
    EDITOR-ADJUNTO DE "COTIDIANO"

    04/10/2015 02h00

    L'irrésistible silhouette bleue/Flickr
    Cavalos selvagens Przewalski, originários da Mongólia que foram extintos e que ressurgiram
    Cavalos selvagens Przewalski, originários da Mongólia que foram extintos e que ressurgiram

    Imagine que uma espécie acabe extinta na natureza —sobram só uns poucos indivíduos em zoológicos.

    Está tudo perdido ou é possível fazer com que esses animais voltem a se adaptar à vida livre e criem uma população viável, com variedade genética entre os indivíduos?

    Um novo estudo, feito com uma interessante subespécie de cavalo, aponta que sim.

    Os cavalos-de-przewalski, que vivem na Mongólia, são os únicos verdadeiramente selvagens que sobraram no mundo. Todos os outros "selvagens", inclusive os famosos mustangues americanos, são na verdade ferais —ou seja, cavalos antes domesticados que voltaram a viver livres.

    Os cavalos mongóis foram nomeados assim em razão do russo de origem polonesa Nikolai Przewalski, que os descobriu em 1881. Nos anos 1960, porém, os bichos já estavam extintos na natureza, por causa da caça e do uso do solo onde viviam para outras atividades, como a pecuária.

    A população chegou a apenas 12 cavalos vivendo em cativeiro, em diferentes locais.

    Ulan Bator, Mongólia

    Nos anos 1970 e 1980, os cientistas conseguiram aumentar esse número. O grande desafio era evitar cruzamentos sequenciais em família, que poderiam levar a doenças genéticas -com tão poucos indivíduos, qualquer barbeiragem poderia comprometer a existência da subespécie.

    A partir dos anos 1990, os bichos foram soltos novamente nas estepes da Mongólia, que são seu habitat —parte dos animais estava em Praga e teve de ser levado de avião pelo Exército Tcheco.

    Duas questões angustiavam os especialistas:

    1) Eles vão cruzar e ter filhotes na natureza? O tempo mostrou que sim. Hoje, há cerca de 500 indivíduos vivendo livres, boa parte já nascida na natureza.

    2) Haverá variabilidade genética suficiente na população para que tais cruzamentos gerem uma prole saudável?

    Em um estudo publicado recentemente na revista "Current Biology", os cientistas analisaram os genomas de 12 cavalos, e o resultado foi que eles se mostraram surpreendentemente heterogêneos.

    Segundo os pesquisadores, liderados por Ludovic Orlando, da Universidade de Copenhague, isso é um estímulo para que se tente recuperar espécies mesmo quando há pouquíssimos sobreviventes —no limite, mesmo que reste apenas um casal.

    Além disso, o estudo permitiu demonstrar geneticamente que realmente há muitas diferenças entre o cavalo-de-przewalski e outras subespécies mais conhecidas. O metabolismo e a propensão a doenças genéticas e os mecanismos de controle muscular, por exemplo, são bem diferentes.

    CARACTERÍSTICAS

    Os cavalos-de-przewalski diferem dos animais que conhecemos por serem indomáveis. Mesmo os indivíduos que foram criados em cativeiro nunca deram muita trela para os humanos, e montá-los é bastante difícil.

    Eles vivem em grupos, e os machos são invariavelmente muito bravos —competem violentamente pelas fêmeas, que são bem mais dóceis, até o dominante subjugar os outros e montar seu harém.

    Além disso, os bichos tem o corpo mais atarracado, com pernas mais curtas —são menos "imponentes" do que seus primos que conhecemos.

    Tais cavalos mongóis se separaram do tronco da evolução equina que deu origem aos outros cavalos há cerca de 160 mil anos.

    Os humanos começaram a ter contato com o tronco não mongol dos ancestrais dos cavalos há no máximo 60 mil anos. No início, estávamos mais interessados em comê-los do que em cavalgá-los -quase todas as espécies domesticadas "começaram a carreira" na panela, aliás, inclusive os cães (mas não os gatos).

    Os primeiros registros de montaria ampla são bem posteriores: tudo indica que os pioneiros foram os membros da cultura Botai, que ocuparam o Cazaquistão cerca de 3.500 anos antes de Cristo —e mesmo eles usavam os cavalos domesticados para, veja só, caçar cavalos selvagens, que comiam.

    Além disso, em 2009 encontrou-se resquícios de leite de égua nas cerâmicas que usavam, o que significa que provavelmente havia consumo da bebida —até hoje, o kumis, um leite de égua fermentado, refrescante e levemente alcoólico, é muito apreciado na Ásia Central.

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