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    Ondas Gravitacionais

    'Há muitas mais detecções por vir', diz pesquisadora das ondas gravitacionais

    MARCELO LEITE
    ENVIADO ESPECIAL A WASHINGTON

    12/02/2016 17h34

    Gabriela González, nasceu na Argentina, em Córdoba, onde estudou física. Veio para os Estados Unidos em 1989 e se apaixonou pela ideia de medir as oscilações no espaço-tempo de que falava seu orientador de doutorado na Universidade de Syracuse (Estado de Nova York), Peter Saulson.

    "Era exatamente o que eu queria fazer", diz com um largo sorriso no rosto a pesquisadora da Universidade do Estado de Louisianna. Um quarto de século depois, ela se tornaria a face pública da detecção das ondas gravitacionais geradas pela colisão de dois buracos negros, previstas por Albert Einstein em 1915.

    Após o doutorado, foi para o MIT e de lá para a Pensilvânia e depois Louisianna -onde foi construído um dos dois detectores Ligo, em Livingston. "Tive muita sorte", conta a física experimental.

    Ela trabalhou diretamente no projeto e na instalação de espelhos suspensos do detector e na caracterização dos dados. Sua função, diz, era fazer os "artefatos" (falsos eventos) desaparecerem, para que os verdadeiros achados aparecessem, como o choque ocorrido 1,3 bilhão de anos atrás.

    Em 2011, González foi escolhida por votação para ser a porta-voz da iniciativa que reunia 16 países e mais de mil pesquisadores. Foi reeleita para a função já duas vezes.

    Leia abaixo a entrevista feita na reunião anual da AAAS (Associação Americana para o Avanço da Ciência).

    Louisiana State University/Divulgação
    A cientista argentina Gabriela González, que trabalhou diretamente no projeto nos EUA que detectou as ondas gravitacionais
    A cientista argentina Gabriela González, que trabalhou diretamente no projeto nos EUA que detectou as ondas gravitacionais

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    Folha - A colaboração no experimento durou 40 anos, e o artigo na "Physical Review Letters" tem mais de mil autores. Qual é a dificuldade envolvida em coordenar tanta gente por tanto tempo?
    Gabriela González - É claro que eu não estive coordenando esse pessoal por 40 anos (risos). Obviamente, é um desafio. Cada um tem uma ideia diferente sobre como as coisas devem ser feitas, como devem ser escritas. Mas todos temos o mesmo objetivo, a mesma missão.

    Temos uma organização interna, com grupos de trabalho separados, trabalhando de baixo para cima. Alguém escreve as partes de análise e todos fornecem comentários, e assim por diante.

    Houve outros eventos detectados pelo Ligo que ainda não foram analisados em detalhe, mas aguardam publicação?
    Bem, nós temos muitos dados, e há coincidências presentes [aparentes eventos registrados pelos dois detectores]. Sempre surgem coincidências quando analisamos os dados. A questão é quão significativas são essas coincidências em relação ao ruído captado pelos detectores.

    Mas há alguma coincidência em que a sra. apostaria seu dinheiro?
    Esse tipo de análise consome muito tempo, muito trabalho. Somos muito cuidadosos antes de falar qualquer coisa a respeito.

    Esse experimento poderá ajudar físicos de partículas a encontrar grávitons, as partículas mediadoras da gravidade?
    A detecção do sinal que encontramos presumia a teoria da relatividade geral, e eles foram muito consistentes. Nossas observações confirmam, se quiser, a teoria da relatividade geral. É uma boa teoria.

    Mas será que isso ajuda a física de partículas? Não é tão claro, porque a física de partículas também presume a teoria da relatividade de Einstein, na busca por uma teoria unificada. Não tenho certeza de que [o Ligo] ajude, mas certamente não atrapalha (risos).

    Houve comparações entre Ligo e as lunetas de Galileu, que abriram os céus para a ciência. Mas ele viu coisas que ninguém havia nem imaginado, como as luas de Júpiter. No caso Ligo, confirmaram-se previsões velhas de décadas. Não seria mais precisa uma comparação com a detecção do bóson de Higgs pelo CERN?
    Acho que se poderia comparar a primeira detecção anunciada, talvez, com o bóson de Higgs. Mas o ponto que estamos tentando enfatizar é que agora podemos usar o Ligo como um observatório.

    Agora se pode realmente olhar para o céu com esses novos ouvidos (sic). Não é só essa primeira detecção, mas muitas mais por vir, de outros sistemas, de outros buracos negros, com massas diferentes. Nós não sabíamos que buracos negros com massas tão grandes existiam. As teorias e previsões eram as mais disparatadas. Nós as estreitamos.

    Agora há um instrumento mais preciso, e essa é a analogia com Galileu - o potencial da ferramenta.
    Isso, exatamente. Encontrar novas luas de Júpiter, por assim dizer.

    Algumas das previsões sobre o cosmos e sua formação vêm sendo confirmadas por essas instalações gigantescas, como o Ligo. Estamos perto de chegar lá, ou vamos precisar de máquinas cada vez mais caras para continuar desvendando sua estrutura?
    Ligo já foi uma máquina bem cara.

    Quanto?
    Ao longo de 25 anos, mais de US$ 1 bilhão. Já era um empreendimento custoso. Mas foi bem-sucedido. Nós não achamos que construir novos laboratórios como esses venha a ser ordens de magnitude mais caro. Não vai custar dez vezes mais. Mas vai provavelmente necessitar de colaboração internacional para que sejam feitos.

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