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    Além do chimarrão, erva-mate pode servir até para combater malária

    ESTELITA HASS CARAZZAI
    DE CURITIBA

    12/10/2016 02h00

    Tiago Pádua/Flickr
    O mate poderia também reduzir colesterol e servir de larvicida
    O mate poderia também reduzir colesterol e servir de larvicida

    Foi observando o chimarrão de cada dia que o pesquisador gaúcho Eloir Schenkel, na década de 1980, pensou que poderia haver algo mais na erva que fervia na cuia.

    "Bah, o que é essa espuma da erva-mate? Será que não é saponina?", disse, segundo lembra a doutora em farmácia Grace Gosmann, então sua colega de pesquisa.

    Ali, se descobriu que a erva típica do Sul do Brasil tinha um composto químico conhecido por suas propriedades detergentes, usado em produtos de limpeza e rações para animais.

    Essa é apenas uma das possibilidades estudadas por pesquisadores brasileiros para a erva-mate –que pode servir de matéria-prima para um sem-número de produtos, como medicamentos, larvicidas, relaxantes e cosméticos.

    "É muito apaixonante pensar que uma mesma planta produz tantos compostos", comenta Grace, da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul) e que pesquisa o tema há 30 anos.

    Desde o primeiro estudo, descobriu-se que o mate pode combater a malária, reduzir colesterol, atuar como larvicida e ter resíduos aproveitados na produção de fertilizantes.

    Além disso, como alimento, pode ter o teor de cafeína alterado com ações de manejo –e ser vendido de energético a bebida descafeinada, tudo com técnicas naturais.

    "É um potencial gigante que temos para começar a produzir patentes, e parar de vender só folha", diz o pesquisador Ivar Wendling, da Embrapa Florestas.

    Na semana passada, o órgão promoveu um seminário da erva-mate em Curitiba. Na plateia, cerca de 300 produtores e pesquisadores, munidos de cuia e garrafa térmica, ouviam as últimas enquanto bebericavam o mate.

    A maior parte dos produtores é de agricultores familiares, espalhados pela região Sul. São cerca de 180 mil famílias, a maioria no Rio Grande do Sul e Paraná.

    A produção brasileira é a maior do mundo: atinge quase um milhão de toneladas ao ano. Mas, no país, a maioria da erva –96%– é usada no chimarrão. Os outros 4% ficam para os chás.

    "A gente sempre fez a mesma coisa", critica Wendling.

    Ele e outros defendem que o polivalente mate sirva de base para produtos naturais, com apelo de mercado principalmente nos EUA e na Europa –que já possui dezenas de patentes de cosméticos e até bebidas que usam erva-mate.

    Quanto aos cosméticos, já há uma grande produção artesanal e Natura e Boticário têm produtos com o componente em seus catálogos.

    "É um produto natural, produzido em floresta, com mão de obra familiar. Veja o apelo social, ambiental e cultural que isso tem", afirma.

    Nos corredores do evento, pesquisadores se queixavam da falta de incentivo da indústria –ou, quando há, da ausência de produção suficiente e padronizada para dar conta da demanda.

    O setor de produtos de limpeza, por exemplo, tem interesse na erva. Uma lei prevê que, até 2025, todos os produtos brasileiros tenham até 60% de compostos industrializados. O resto deve ser natural. O uso de mate nesses produtos ainda é experimental.

    A indústria alimentícia também começa a explorar as propriedades do mate. Cristiane Helm, da Embrapa Florestas e doutora em Ciência de Alimentos, conduz pesquisas sobre os antioxidantes naturais da erva. A substância combate radicais livres e previne o envelhecimento.

    Em determinadas variedades, um copo de chá mate, por exemplo, pode ter até três vezes mais antioxidantes que uma taça de vinho, segundo Helm. Já existem "árvores-pilotos" sendo cultivadas no Paraná. Mas falta impor padrões à produção no campo.

    Eventos como o da Embrapa tentam unir produtores e pesquisadores, a fim de aperfeiçoar a produção, criar protocolos para o mate e cobrar políticas públicas, que impulsionem o setor.

    "Não foi à toa que a Coca-Cola comprou a Mate Leão", diz Gosmann. "É um nicho de mercado enorme."

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