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    Cientistas trazem de volta memórias esquecidas

    RICARDO BONALUME NETO
    DE SÃO PAULO

    01/12/2016 15h00 - Atualizado às 15h48

    David Lee/Associated Press
    Atores Kate Winslet e Jim Carrey no filme "Brilho Eterno de uma Mente Sem Lembranças", de Michel Gondry
    Kate Winslet e Jim Carrey no filme "Brilho Eterno de uma Mente Sem Lembranças", de Michel Gondry

    Sabe aquele número de pizzaria que você memorizou e que, logo após discar o último algarismo, foi imediatamente esquecido? Cientistas conseguiram desvendar um pouco de como funciona o descarte de memórias e até "ressuscitá-las".

    O conceito de memória é definido como a capacidade de obter, armazenar e recuperar informações no cérebro. Existem dois tipos principais, a memória de curto prazo –que dura alguns segundos ou minutos– e a de longo prazo– que faz a pessoa lembrar de algo vários dias, meses ou anos depois.

    A memória de curto prazo também costuma ser chamada de "memória de trabalho", pois é aquela usada praticamente todo o tempo.

    Os cientistas achavam que mesmo para guardar um número de telefone ou lembrar o nome de uma pessoa recém-apresentada por poucos instantes seria preciso que as células nervosas do cérebro (os neurônios) vinculadas a essa memória deveriam estar constantemente ativas.

    No caso de a pessoa achar o número de telefone e/ou o nome do novo conhecido importantes, esses dados são armazenados a longo prazo pela memória de longa duração.

    Um novo estudo da equipe de Nathan Rosen, das universidade de Wisconsin e Notre Dame, EUA, demonstrou agora que os neurônios conectados a esse tipo de memória não precisam estar tão "ligadões" assim. Essas zonas ativas de contato entre uma terminação nervosa e outros neurônios são conhecidas como "sinapses".

    Os neurônios podem ficar em estado latente, mostrando que a atividade cerebral ligada a essa memória só precisa reaparecer quando a pessoa que tenta lembrá-la conscientemente focaliza sua atenção nela. Ou seja, a memória que tinha sido deixada de lado –como o número de telefone antes considerado não importante– passa a ser "reativada".

    EVIDÊNCIAS

    "A capacidade de armazenar informações na memória de trabalho é fundamental para a cognição. Ao contrário da antiga visão de que a memória de trabalho depende de uma atividade elevada e sustentada, apresentamos evidências que sugerem que os seres humanos podem armazenar informações na memória de trabalho através de mecanismos sinápticos 'silenciosos em atividade'", escreveram Rose e colegas em artigo na última edição da revista "Science".

    Eles usaram um modelo matemático para analisar padrões de atividade cerebral. Os testes envolveram observar rapidamente imagens, palavras ou movimentos, e prestar atenção em dicas capazes de identificá-los, enquanto o cérebro era escaneado por ressonância magnética.

    Memória a curto prazo

    A reativação foi ajudada por estimulação com uma técnica magnética não invasiva, que usa rápidos campos magnéticos para enviar um impulso elétrico ao cérebro. Se o impulso for na área do cérebro inicialmente ativa, a resposta de reativação é mais intensa.

    "Nossos resultados fornecem evidência empírica para a existência de um mecanismo de plasticidade [maleabilidade] de curto prazo que provavelmente é fundamental para uma ampla gama de funções cognitivas, envolvendo a focalização da atenção e que pode fornecer os peças para a construção de mecanismos de potencialização de longo prazo que apoiam as memórias desse tipo", escreveram os autores.

    "Nossos resultados introduzem uma via potencial para reativar e fortalecer representações que estão subjacentes a muitas classes de cognição de alto nível",concluem.

    O estudo não explica o mecanismo pelo qual as sinapses ou outras características neurais podem conter este segundo nível de memória de trabalho, ou quanta informação poderia ser armazenada.

    "É um primitivo passo inicial na compreensão de como levamos as coisas à mente", diz o neurocientista cognitivo Bradley Postle, da Universidade de Wisconsin, coautor do estudo.

    Em termos práticos, os resultados de estudos na área poderão ajudar pessoas com problemas de memória como amnésia, epilepsia e esquizofrenia.

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