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    Alexandra Forbes

    Bordeaux começa a se rebelar contra a proibição do chardonnay

    16/10/2016 02h00

    Em 2010, dois jovens vinicultores franceses arriscaram sua sorte. Benoit Trocard (Vignobles Trocard) e Bertrand Mouty (Vignobles Daniel Mouty), cada qual com sua vinícola familiar, plantaram vinhas de chardonnay, uva branca proibida em sua região. A França é famosa por impor complicadíssimas regras de elaboração e classificação de vinhos, que dificultam a vida de quem produz e de quem bebe. Mouty e Trocard mandaram a proibição do chardonnay às favas.

    O chardonnay, originalmente da Borgonha, região vizinha a Bordeaux, hoje existe no planeta inteiro (inclusive no Brasil) e dele fazem vinhos de muitos estilos (na Califórnia, por exemplo, tendem a ser dourados, densos e amanteigados). Todo mundo tem direito de produzir chardonnay exceto... os franceses de Bordeaux! Eles podem plantar a casta legalmente, mas o vinho resultante é penalizado com a apelação "vira-lata" Vin de France, zero prestigiosa.

    Impávidos, os dois foram em frente e lançaram seus respectivos chardonnays, produzidos em quantidades ínfimas. O Dubreuil, de Trocard, elegante e delicado, custa € 40 na França, e o Nouvelle Terre de Mouty, € 18. Ambos, no entanto, são difíceis de achar.

    Mick Rock/Divulgação
    Colheita de uvas chardonnay na região da Borgonha, na França
    Colheita de uvas chardonnay na região da Borgonha, na França

    No ano seguinte, a dupla ganhou um concorrente peso-pesado. Jean-Luc Thunevin, dono do Château Valandraud, lenda viva do mundo do vinho, fez fama nos anos 1990 quebrando as rígidas regras bordalesas. Tem, entre outros vinhos, o cult Bad Boy, um blend tinto. Em 2014, lançou um Bad Boy 100% chardonnay, bordalês, hit instantâneo. "Não ligo para a proibição de botar Bordeaux no rótulo. Meus vinhos vendem porque as pessoas sabem o que esperar de mim, a marca tem mais força do que as amarras das leis francesas", diz.

    Esses chardonnays proibidos —e bastante bons— são pontas de lança de uma revolução nascente. Finalmente Bordeaux começa a rebelar-se contra as regulações draconianas das apelações de origem. Pelo caminho por onde vão esses pioneiros outros seguirão, pois faz todo o sentido plantar uma das uvas mais adoradas do mundo em terras sabidamente propícias para seu cultivo. Enquanto continuarem proibidos, os chardonnays bordaleses "ovelhas negras" custarão menos do que valem. Tradução: compre quem puder!

    alexandra forbes

    É jornalista gastronômica, 'foodtrotter' e autora de 'Jantares de Mesa e Cama'. Escreve aos domingos, a cada duas semanas.

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