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    Alexandra Forbes

    Inimigo da autoestima

    18/06/2017 02h00

    Divulgação
    Interface do aplicativo Instagram
    Interface do aplicativo Instagram

    Dos meus muitos vícios, o Instagram tornou-se o pior. Acordo e olho as fotos postadas. Tomo café e volto a olhar. E dali em diante é assim, até a hora de dormir.

    Na rede, sigo majoritariamente gente que adora comer e beber, mas também amigas da turma do suco verde. Pessoas que fazem muito exercício e fogem de pão e de doces como o diabo da cruz.

    Sábado passado, acordei às dez horas sem vontade de sair da cama. O primeiro post que vi era da minha chefe, de sorrisão largo, terminando um circuito com seu personal trainer.

    Uma amiga minha posta todo dia imagens de seu café da manhã, que sempre inclui toranja e vitaminas –e nunquinha um pão com manteiga.

    Outra virou "health coach" (conselheira de saúde, em tradução livre) e posta os palitos de pepino e cenoura que os filhos comem no lanche, suas mil receitas "low-carb" e selfies em que aparece sarada, de biquíni, ou pendurada de ponta-cabeça fazendo uma modalidade aérea de ioga.

    Sofro, confesso. Pergunto-me: "Por que não corro no parque cedinho nem encaro um suco verde?" Fazendo ioga, sou ridícula.

    Meus esportes favoritos? Pingue-pongue e sinuca. Sofreria ainda mais se tivesse que ver selfies de gatas malhadas, magras e explodindo de felicidade –felizmente, no meu "feed" de postagens predominam vinhos e comidas.

    Como eu, a maioria sofre. Estudo divulgado no mês passado pelo instituto inglês Royal Society for Public Health comprova que "as pessoas estão vivenciando (no Instagram) um fluxo quase infinito de experiências alheias que podem fazer-lhes sentir como se estivessem perdendo o bom da vida".

    Há uns dias, o The New York Times abordou o tema na reportagem "Why 'Radical Body Love' Is Thriving on Instagram ("Porque o amor radical ao próprio corpo está prosperando no Instagram", em tradução livre).

    O jornal narra a ascensão fulminante de Tess Holliday (@tessholliday, com 1,4 milhões de seguidores), a modelo gorda mais famosa dos Estados Unidos. Obesa, sexy e com rosto lindo, ela posta fotos em que aparece seminua, fazendo caras e bocas e amando seu corpo.

    Invejo a inabalável autoestima dela, assim como o autocontrole das minhas amigas que almoçam sementes no vapor e malham todos os dias.

    Da mesma forma que meus seguidores sonham em replicar minhas comilanças pelo mundo e cobiçam os vinhos que bebo (são eles mesmos que dizem isso!).

    A grama sempre é mais verde no quintal do vizinho. E o Instagram nos joga isso na cara sem dó.

    alexandra forbes

    É jornalista gastronômica, 'foodtrotter' e autora de 'Jantares de Mesa e Cama'. Escreve aos domingos, a cada duas semanas.

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