• Colunistas

    Monday, 06-May-2024 14:35:58 -03
    Alexandre Schwartsman

    Caixa dois e presentes se encontram na raiz do baixo crescimento

    26/04/2017 02h00

    Pedro Ladeira/Folhapress
    Ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato, em sessão do STF que julga recurso de Lula e pedido de liberdade para Eduardo Cunha
    O ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato, em sessão do STF

    Corrupção é um problema central para entender o mau desempenho econômico do Brasil, mas não da maneira como geralmente aparece no discurso popular. Não é raro receber e-mails ou perguntas no blog sobre o impacto fiscal da roubalheira generalizada que tem assolado o país. Como regra, os interlocutores saem desapontados com as respostas.

    A pilhagem associada às atividades investigadas pela Lava Jato, por exemplo, é estimada na casa deR$ 43 bilhões, grana para lá de razoável, mas que empalidece diante do montante do gasto público do governo federal em 2017: R$ 1,3 trilhão. Ao longo de muitos anos roubaram-se pouco mais de 3% do que o governo federal gastará apenas neste ano.

    É uma ilusão, portanto, achar que o combate à corrupção resolverá a questão do gasto público, mas isso não o torna menos importante.

    A corrupção tem um efeito corrosivo na capacidade de crescimento do país e está profundamente ligada à enorme presença do Estado na economia.

    Há essencialmente duas formas de ganhar dinheiro: uma, virtuosa, envolve a atividade inovadora. Novos produtos, novos processos, novos mercados geram enormes lucros para empreendedores e ao mesmo tempo modificam o entorno econômico e social de maneira radical.

    No processo, a produtividade aumenta, e, com ela, o padrão de vida da população: entre 1820 e 2010, por exemplo, estima-se que a renda per capita global tenha aumentado dez vezes, de US$ 712 para US$ 7.814 (a preços de 1990). O aumento de produtividade explica a maior parte desse fenômeno.

    A alternativa envolve tomar dinheiro alheio, nem sempre por meios ilegais. Monopólios (ou oligopólios) criados artificialmente; barreiras à competição, seja local, seja internacional; subsídios, explícitos ou não, são algumas das práticas que permitem a segmentos politicamente conectados também remodelar o entorno econômico para capturar essa renda, sem, contudo, produzir a aceleração da produtividade que permite o aumento persistente do bem-estar.

    A corrupção está intimamente entrelaçada às atividades acima descritas. O acesso a elas tipicamente passa pelo poder público e, portanto, quem quiser esse acesso terá de pagar a quem estiver no controle do aparato governamental naquele momento (ou com perspectivas de tomar o controle desse aparato mais à frente).

    Também não é preciso muito para concluir que países em que o setor público interfere de maneira mais frequente e intensa no domínio econômico oferecem mais oportunidades para ganhos ligados a práticas de captura da renda da sociedade e, portanto, mais corrupção.

    Assim, quanto mais discricionária for a política econômica, privilegiando alguns setores sobre os demais, tanto maior será a roubalheira. O efeito colateral desse arranjo é o crescimento medíocre da produtividade e, portanto, do bem-estar. Ao contrário do que proclamou Eugênio de Aragão, ex-ministro da Justiça (ainda bem!), corrupção não é "graxa na engrenagem da máquina"; é só areia!

    Caixa dois e presentes fazem certamente parte dos nossos "usos e costumes". Nem por isso, porém, devem ser tolerados, pois se encontram na raiz do baixo crescimento. Reclamar do câmbio e pedir anistia à corrupção pode ajudar os que vicejam nesse arranjo perverso, mas, com certeza, não há de nos colocar na rota do crescimento acelerado.

    alexandre schwartsman

    Ex-diretor de Assuntos Internacionais do BC, é
    doutor em economia pela Universidade da Califórnia.
    Escreve às quartas, semanalmente.

    Edição impressa

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024