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    Alexandre Schwartsman

    Medo do futuro joga os juros futuros para cima

    22/11/2017 02h00

    Pedro Ladeira - 10.ago.17/Folhapress
    BRASILIA, DF, BRASIL, 10-08-2017, 15h00: O presidente Michel Temer, acompanhado dos ministros Henrique Meirelles (fazenda), Ronaldo Nogueira (Trabalho) e Dyogo Oliveira (Planejamento) e do presidente da Caixa Gilberto Occhi, durante Cerimônia de Anúncio de Distribuição dos Resultados do FGTS, no Palácio do Planalto. (Foto: Pedro Ladeira/Folhapress, PODER)
    Henrique Meirelles e Michel Temer; indefinição sobre reforma cobra conta na forma de alta do juro futuro

    A calma do mercado financeiro esconde uma preocupação séria. Muito embora o Banco Central tenha reduzido a Selic a 7,5% e praticamente prometido que chegará a 7% no fim do ano, nível mais baixo da história, o mercado de renda fixa tem apontado na direção de juros bem mais altos à frente.

    Para entender esse aparente paradoxo, considere um exemplo simples. Imagine que uma investidora possa aplicar seu dinheiro por um ano (e reaplicá-lo no ano seguinte) ou fazer uma aplicação diretamente por dois anos. Vamos admitir que ela saiba que a taxa de juros será, com certeza, 5% no primeiro ano e 10% no segundo. Assim, uma aplicação de R$ 100 valeria R$ 105 ao final do primeiro ano e R$ 115,50 no segundo.

    A alternativa sob tais circunstâncias, o investimento por dois anos, não pode render menos do que R$ 115,50 (senão jamais será escolhido) nem mais (senão o tomador de dinheiro preferirá fazer a operação em dois passos). É fácil concluir, portanto, que uma aplicação por dois anos requer uma taxa de juros equivalente a 7,5% ao ano, que gera esse exato valor.

    Na prática, as coisas não são tão simples, a começar porque não sabemos toda a sequência de taxas de juros de curto prazo ao longo de períodos mais extensos.

    Imagine agora que a taxa de juros do segundo período possa ser 10% ou 15% (cada qual com 50% de chance). Agora o valor esperado do investimento é R$ 118,125 (0,5 x R$ 115,50 + 0,5 x R$ 120,75), ou seja, a taxa de juros para dois anos subiria para 8,7% ao ano, sob a suposição de que nossa investidora seja neutra com relação a risco. Se não gostar de correr riscos, pedirá um pouco mais, talvez 9% ao ano para aplicar por dois anos.

    Hoje vemos um caso semelhante. A taxa de juros para uma aplicação de um ano é pouco superior a 7% anuais, enquanto a taxa de juros para cinco anos se encontra ao redor de 10% ao ano.

    Interpretado à luz do exemplo acima, isso sugere que o mercado de renda fixa embute expectativas de um aumento considerável das taxas de juros nos próximos anos, chegando a 11% ao ano, mesmo com as expectativas de inflação bem comportadas.

    A elevação da taxa de juros ao longo de 2019 não é exatamente uma surpresa.

    Embora a Selic deva mesmo cair e continuar baixa em 2018, pelo menos, à medida que a inflação retorne à meta e a economia se aproxime do pleno emprego, é natural que a taxa Selic também suba.

    O problema, no caso, é que —de acordo com as melhores estimativas hoje disponíveis—, com uma meta de inflação de 4%, a Selic deveria atingir perto de 8% ao ano, não 10% ou 11%, como implicado no mercado de renda fixa. Por que tamanha diferença?

    Prêmios de risco crescentes podem explicar o fenômeno, ao menos parcialmente, refletindo a incerteza que cerca a trajetória de juros depois de 2018.

    Uma explicação alternativa (mas não excludente) sugere que, na ausência de um ajuste fiscal consistente, tanto a inflação tenderia a subir mais como a taxa real de juros necessária para combater esse fenômeno também teria que ser mais alta. Em outras palavras, é o medo do futuro que empurra o juro longo para cima.

    A incapacidade do atual governo de aprovar reformas essenciais e o receio acerca do comprometimento de futuras administrações com o ajuste começam a cobrar a conta. Não perdemos jamais a oportunidade de perder uma oportunidade.

    alexandre schwartsman

    Ex-diretor de Assuntos Internacionais do BC, é
    doutor em economia pela Universidade da Califórnia.
    Escreve às quartas, semanalmente.

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