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    Alexandre Vidal Porto

    Longe dos olhos, longe do coração

    06/09/2014 02h00

    Nesta semana, a ministra da Educação e a ministra do Comércio da Colômbia revelaram que formam um casal lésbico.

    As duas passam a integrar um seleto grupo de chefes de governo e autoridades de primeiro escalão abertamente homossexuais, como o primeiro-ministro da Bélgica, o primeiro-ministro de Luxemburgo e o ministro das Relações Exteriores da Alemanha, entre outros.

    Esse grupo não inclui brasileiros. Não que eles não existam. Eles existem, mas não se revelam. Estima-se que cerca de 10% da população do mundo seja homossexual.

    Se as estimativas estiverem corretas, 8,1 senadores, 51,3 deputados e 3,9 ministros, por exemplo, são gays. No entanto, em nível federal, o único homossexual assumido que eu conheço é o deputado Jean Wyllys. Pergunto-me: quem seriam os demais?

    Não é só na classe política que os gays são invisíveis. É na classe artística, entre os empresários e no mundo acadêmico também.

    Em comparação a países avançados, são mínimos no Brasil a exposição e o ativismo político de personalidades que poderiam ajudar a combater estereótipos e contribuir para a aceitação pública da homossexualidade. Elas preferem omitir-se.

    No Brasil, impera a noção arcaica de que quanto mais bem-sucedido um gay, mais enfiado no armário ele ou ela deve estar. É como se, ao revelar sua homossexualidade, uma pessoa fosse botar a perder suas conquistas e destruir a sua vida. Todo gay no armário já sentiu esse medo. Vive-se uma mentira. Vende-se ao mundo outra.

    A atitude mais política que um homossexual pode tomar é sair do armário. É a melhor maneira de conquistar aliados.

    As pessoas são mais propensas a apoiar o direito à igualdade quando conhecem e convivem com indivíduos abertamente gays.

    Trata-se de uma questão pessoal, mas não se assumir denota egoísmo e falta de responsabilidade social. Quem não é visto, nem reconhecido, não pode ser considerado -nem pelos amigos, nem pela família, nem pelo governo.

    É como dizem: longe dos olhos, longe do coração.

    A visibilidade de gays bem-sucedidos fortalece a luta pela igualdade. Confere orgulho e serve para combater a noção maligna de que a homossexualidade é uma falha moral, que vai destruir as possibilidades existenciais de quem se identificar com ela.

    Quando alguém diz ao garoto alemão que ele está condenado na vida por ser gay, ele pode responder: eu posso ser o ministro das Relações Exteriores. No Brasil, o garoto fica sem ter o que dizer.

    Para que a homossexualidade seja vista com naturalidade, o elemento mais importante é a coragem.

    Dos governantes, para que sejam justos e não sucumbam às chantagens de quem semeia ódio e se aproveita desse segmento social vulnerável para conseguir poder político. Dos homossexuais, a coragem que se exige é de se mostrarem no dia a dia e se afirmarem nos grupos sociais de que participam.

    Dá um medo terrível, mas é melhor do que baixar a cabeça e ter a vida e a dignidade roubadas.

    alexandre vidal porto

    Escreveu até outubro de 2016

    Escritor e diplomata, mestre em direito (Harvard). Serviu na missão na ONU e no Chile, EUA, México e Japão. É autor de "Sergio Y. vai à América" (Cia das Letras).

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