RIO DE JANEIRO - Em crises passadas, havia uma teoria otimista que explicava por que o mercado editorial não batia no fundo do poço. A lógica era simples: comprar um romance para ler no fim de semana era muito mais barato do que qualquer outro programa. Até um cineminha na sessão da tarde no poeira do bairro, sem pipoca, em comparação saía mais caro.
Como outras, devia ser uma teoria furada - livro no Brasil sempre foi caro, apesar de os editores insistirem em dizer o contrário. Agora não tem escapatória: recente pesquisa mostra que o mercado editorial encolheu 12,6% em 2015, pior número desde 2002. A causa da queda está justamente no setor de vendas a varejo, e o segmento que mais perdeu leitores foi o da ficção.
Outra pesquisa mapeia a situação. Segundo a Retratos da Leitura, o brasileiro lê cinco livros por ano: 4,96. Desses, quase três (2,88) são indicados pela escola. O público leitor ultrapassa a metade da população: 56%. Considerou-se como "leitor" quem leu, inteiro ou em parte, pelo menos um livro durante os últimos três meses. "Em parte" quer dizer exatamente o quê? As orelhas? A primeira linha ou o primeiro capítulo?
Nada contra largar um livro no meio, é uma das decisões mais sábias que se pode tomar na vida. Só que é preciso definir melhor se hoje ainda há heróis da resistência ou se a concentração para ler é um hábito perdido no tempo. No mais, a Bíblia é a campeã de vendas - e um exemplo perfeito de leitura fragmentária.
Mas eis que durante quatro dias somos o país da literatura. A palavra mágica é Flip, que começa no fim do mês. Se eu fosse você, não perderia as mesas das poetas Laura Liuzzi e Marília Garcia, dos mexicanos Valeria Luiselli e Álvaro Enrigue, da Nobel bielorrussa Svetlana Aleksiévitch. E ainda pediria uma aula prática de lavar louça ao Karl Ove Knausgård.
Trabalha como jornalista desde 1988. Em redações de jornais e revistas cariocas, foi repórter, redator, editor, colunista. Escreve às terças.