RIO DE JANEIRO - Que se saiba não mora em Paquetá nenhuma onça, como aquela, de nome Juma, morta em Manaus depois de ter sido exibida na cerimônia de revezamento da tocha olímpica. Nem mesmo o Acerola, um dos últimos 35 botos-cinza existentes na baía de Guanabara, brinca mais no seu litoral, pois também morreu — em meados do mês, ele foi achado num lixão da ilha do Governador, com sinais de esquartejamento.
Às vezes tem-se a impressão de que Paquetá não existe, embora fique a menos de 30 minutos do centro do Rio, na viagem de catamarã. A chama da Olimpíada, por exemplo, resolveu ignorar solenemente seu 1,2 quilômetro quadrado de área e a população de cerca de 4.000 habitantes.
Descoberta em 1555 pela expedição fundadora da França Antártica e com dezenas de pequenas praias, hoje só no Carnaval ou quando algum estudante é obrigado a ler o romance "A Moreninha", de Joaquim Manuel de Macedo, a ilha é lembrada. Recentemente lhe tiraram as tradicionais charretes a cavalo, substituídas por carrinhos elétricos nos passeios turísticos.
Ao menos o compositor Aldir Blanc, em letras de sambas, choros, ranchos e boleros ("Paquetá, Dezembro de 1956", "Choro das Ondas", "Santo Amaro", "Latin Lover"), registrou a importância da ilha na memória sentimental dos cariocas. Aldir, em sua fogosa adolescência, era conhecido como o Bardo de Paquetá.
Mas eis que um amigo cismou com o recanto, reatribuindo-lhe os epítetos de Ilha dos Amores e Pérola da Guanabara. Um paraíso onde os Jogos Olímpicos não conseguem penetrar. Ele fez as contas e descobriu que serão 17 dias corridos de competição — de 5 a 21 de agosto — e, para o período, conseguiu alugar uma casa na praia dos Tamoios. Vai ficar sozinho, em retiro espiritual, tendo como companhia uma vitrola e antigos LPs. Só com músicas de Aldir Blanc.
Trabalha como jornalista desde 1988. Em redações de jornais e revistas cariocas, foi repórter, redator, editor, colunista. Escreve às terças.