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    Alvaro Costa e Silva

    Voando com Fidel

    06/12/2016 02h00

    Rafael Perez-1.mai.2004/Reuters
    Then Cuban President Fidel Castro glances over his shoulder during the May Day commemoration at Revolution Square in Havana, in this May 1, 2004 file photo. Picture taken May 1, 2004. REUTERS/Rafael Perez/Files (CUBA - Tags: POLITICS ANNIVERSARY OBITUARY)
    Fidel Castro durante comemoração na Praça da Revolução, em Havana

    RIO DE JANEIRO - Em abril de 1959 Fidel Castro fez a primeira viagem internacional após o triunfo da revolução. O destino inicial foi Washington DC; em seguida, Nova York. Só depois chegaria a vez da América do Sul, a começar pelo Rio.

    O escritor Guillermo Cabrera Infante — revolucionário de primeira hora que mais tarde se tornaria o maior opositor do regime no campo intelectual — integrou a comitiva de viagem. O avião que os conduzia baixou para que se pudesse ver a Amazônia. O piloto disse: "Comandante, estamos sobrevoando a floresta". Fidel exclamou: "Que grande país!". Cabrera Infante, sentado no banco de trás, pensou tratar-se de admiração verdadeira pelo Brasil. Mas o líder, perdendo-se na contemplação do mundo verde, prosseguiu: "É aqui que devíamos ter feito a nossa revolução".

    Naquele momento Cabrera Infante entendeu que Cuba era pequena para aquele homem que se achava tão grande que necessitava de um continente: uma ilha só não bastava. A intimidade de estar na companhia do barbudo, num avião a hélice, a imensa selva a perder de vista, convenceu o escritor — não por acaso, um admirador de Joseph Conrad — que Fidel Castro era "o horror". Ao longo da vida, exilado em Londres, teria inúmeras provas das trevas na ilha.

    G. Cain — como o autor de "Três Tristes Tigres" e "Havana para um Infante Defunto" assinava suas crônicas de cinema — morreu em fevereiro de 2005. Quarenta anos antes "fora saído" de Cuba para nunca mais voltar. No domingo (4), após nove dias de funerais, as cinzas de Castro foram enterradas. Como dizia o comunista João Saldanha, vida que segue.

    E fim do luto. Entre um ditador e um escritor, sempre ficarei ao lado do segundo. É uma questão de afinidade, para usar o mote daquele programa de televisão inspirado nos piores pesadelos totalitários de George Orwell.

    alvaro costa e silva

    Trabalha como jornalista desde 1988. Em redações de jornais e revistas cariocas, foi repórter, redator, editor, colunista. Escreve às terças.

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