• Colunistas

    Thursday, 02-May-2024 08:14:51 -03
    André Barcinski

    Encontro de iconoclastas

    24/04/2016 02h00

    Não seria exagero dizer que, estilisticamente, o cineasta norte-americano Abel Ferrara é discípulo do grande Pier Paolo Pasolini. Quem já viu filmes como "O Rei de Nova York" (1990), "Vício Frenético" (1992) ou o recente "Bem-Vindo a Nova York" (2014) percebe que Ferrara tem muita afinidade com o cinema sujo, violento e poético do gênio italiano, morto em 1975, aos 53 anos, espancado e atropelado em um terreno baldio nos arredores de Roma.

    Em "Pasolini", Ferrara conta os últimos dias de vida do diretor. Willem Dafoe, sempre fora de série, interpreta o protagonista à época do lançamento de "Salò", seu polêmico filme baseado no romance "120 Dias de Sodoma", do Marquês de Sade.

    Foi uma época conturbada para o cineasta. Nas entrevistas, ficou evidente a sensação de deslocamento e isolamento numa sociedade italiana cada vez mais conservadora e materialista. Pasolini reclamava da crescente dificuldade para produzir seus filmes e vivia em companhia da mãe, Susanna, e da prima, Gabriela. À noite, saía para explorar o submundo gay em noitadas com garotos de programa.

    Ferrara não é um cineasta convencional e, com um tema desses, não dava para esperar nada muito usual do filme. Em vez de fazer uma cinebiografia ordinária, "do berço ao túmulo", ele ignora detalhes biográficos e tenta dar sua versão das motivações e do espírito anárquico e combativo de Pasolini.

    Em outra entrevista, Pasolini definiu o momento político, social e cultural da Itália de 1975 como "a situação": "Eu desço ao inferno, e sei muitas coisas que ainda não tiram a paz dos outros. Mas fiquem atentos: o inferno vai chegar a vocês. (...) Não se iludam: vocês, com a sua escola, a televisão, a pacatez de seus jornais, são os grandes conservadores dessa ordem horrenda baseada na ideia de possuir e na ideia de destruir".

    Pier Paolo Pasolini foi um grande pensador, poeta e cineasta. Que bom que este filme caiu nas mãos de um dos poucos contemporâneos capazes de lhe fazer justiça.

    PASOLINI
    DIRETOR: ABEL FERRARA
    QUANTO: R$ 49,90
    ANO: 2014
    DISTRIBUIDORA: IMOVISION

    VEJA O TRAILER

    video

    Conexões

    FILMES

    BEM-VINDO A NOVA YORK
    Inspirado na história do francês Dominique Strauss-Kahn, ex-diretor do FMI preso em 2011 acusado de violentar uma camareira, Ferrara faz alegoria sobre homens poderosos e delírios de superioridade. Gérard Depardieu está sensacional.
    DIRETOR: ABEL FERRARA
    QUANTO: R$ 42
    ANO: 2014

    MAMMA ROMA
    Um dos maiores filmes de Pasolini, traz Anna Magnani como uma prostituta que faz tudo por uma vida melhor ao filho. Foi o segundo longa do diretor e traz influências do neorrealismo, mas com os tons delirantes e surrealistas que marcariam seu cinema a partir do fim dos anos 1960. Um clássico.
    DIRETOR: Pier Paolo Pasolini
    QUANTO: R$ 49,60
    ANO: 1962
    DISTRIBUIDORA: Versátil

    -

    OUTRAS SUGESTÕES PARA CURTIR EM CASA

    LIVRO

    LINHA M
    AUTOR: Patti Smith
    QUANTO: R$ 39,90; e-book R$ 27,90 (216 págs)
    ANO: 2016
    EDITORA: Companhia das Letras

    Se o primeiro de Patti Smith, o autobiográfico "Só Garotos", relatou a vida na alucinada Nova York dos anos 1970 com o fotógrafo Robert Mapplethorpe, aqui ela dá complemento mais tranquilo à loucura, embora as memórias incluam a morte do marido, Fred "Sonic" Smith, guitarrista do MC5, em 1994.

    *

    DISCOS

    SUPER
    AUTOR: Pet Shop Boys
    ANO: 2016
    QUANTO: R$ 57 –importado
    GRAVADORA: x2 Recordings

    Desde que se conheceram numa loja em Londres, há 35 anos, Neil Tennant e Chris Lowe vêm fazendo pop eletrônico de primeira, com batidas dançantes e letras irônicas e espertas. "Super", produzido pelo craque Stuart Price (Madonna, New Order), mostra que os veteranos seguem imbatíveis no ramo "pop para adultos".

    GENIUS OF TIME
    AUTOR: Larry Levan
    ANO: 2016
    QUANTO: R$ 83 -importado
    GRAVADORA: Universal Music

    Larry Levan foi um nome forte da cena "clubber". DJ habilidoso e carismático, fez fama na década de 1970, em Nova York. Depois, virou produtor e "remixer", mas teve a carreira ceifada pela heroína e morreu aos 38 anos. O CD duplo tem 22 versões de artistas como Esther Williams e Smokey Robinson. Um Santo Graal da house music.

    Edição impressa

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024