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    André Conti

    Velho novo

    06/02/2013 06h29

    Quando se fala em gênero no mundo dos jogos, trata-se de algo um pouco distinto dos habituais "aventura", "comédia", "drama" etc. Aqui, o gênero diz mais respeito a um certo tipo de interação com o jogo do que alguma classificação temática.

    Assim, um "adventure' pode ser cômico ("Monkey Island") ou de fantasia ("Quest for Glory"), por exemplo, e o que vai definir o gênero de um jogo de terror é o enfoque: primeira pessoa, sobrevivência, quebra-cabeças, ação e assim por diante.

    Mais que isso, esses gêneros dependem de certos saltos tecnológicos. O adventure imperou nos anos1990 porque os fundos estáticos e os gráficos pixelados representavam o auge tecnológico de sua época. Foi necessário o aprimoramento do 3D para que os jogos de tiro em primeira pessoa pudessem surgir e se popularizar.

    Por isso, gêneros vêm e vão, são esquecidos e redescobertos. Mas há os clássicos. Aquelas formas imutáveis que sobrevivem aos avanços e que encontram um público que simplesmente não os deixa morrer. Eles podem ter picos de popularidade, acomodar-se em nichos, mas estarão sempre lá.

    O RPG japonês é um desses gêneros. Tipicamente destinado a consoles, ele surgiu como uma consequência natural dos RPGs de mesa, como "Dungeons & Dragons" e "GURPS".

    Essa herança acabou definindo algumas de suas principais características: mundos enormes, combate por turnos, tramas elaboradíssimas. Uma fórmula que garantiu décadas de sucesso

    Nos últimos tempos, porém, essa fórmula voltou-se contra o gênero, pelo menos no Ocidente. Enquanto os japoneses seguiam recebendo suas doses quase mensais de RPGs, poucos desses jogos passaram a ser traduzidos e lançados por aqui. Foi preciso, por exemplo, uma campanha internacional para que "Xenoblade Chronicles", do Wii, chegasse aos EUA.

    Agradeço, portanto, à boa alma que decidiu lançar "Ni no kuni: Wrath of the White Witch" no Ocidente. O jogo, exclusivo para o Playstation 3, é o primeiro grande título de 2013 e a renovação que o gênero precisava.

    O curioso é que ele não traz nada de exatamente novo ao RPG japonês. Suas mecânicas de jogo foram pinçadas de dezenas de outros títulos, e qualquer fã do gênero vai reconhecer essas influências. A própria criadora, a LEVEL-5, responsável pelo maravilhoso "Dragon Quest VIII", é quase uma empresa de "confort gaming": sabemos o que esperar de seus jogos, e gostamos deles justamente por isso.

    O impressionante é o quanto "Ni no kuni" acerta. A direção de arte, encomendada aos estúdios Ghibli, transporta o jogador a um universo semelhante ao de filmes como "A Viagem de Chihiro" e "Ponyo", do japonês Hayao Miyazaki.

    A própria trama lembra a obra de Miyazaki: uma história aparentemente simples, até infantil, que se desdobra num épico que não faz concessões à idade do jogador, e que oferecerá a cada público, seja ele juvenil ou adulto, graus distintos de complexidade. Até o combate, que combina elementos da série "Tales" a laivos de "Pokemon", não se torna repetitivo após dezenas de horas de jogo.

    Para um título que exigirá até noventa horas do jogador que quiser explorá-lo por completo, é imperativo que todos esses fatores caiam no lugar. Sem reinventar a roda, a LEVEL-5 revitalizou um gênero estanque e abriu 2013 em grande estilo.

    andré conti

    Escreveu até maio de 2013

    Formado em jornalismo, é editor na Companhia das Letras. Sua coluna misturava coisas antigas e jogos velhos com novidades e curiosidades da tecnologia.

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