• Colunistas

    Wednesday, 15-May-2024 18:29:25 -03
    André Singer

    Da arte de engolir sapos

    01/06/2013 03h30

    Para Maquiavel, a virtude política consiste em agir de acordo com a natureza dos tempos. O condutor virtuoso seria aquele com a coragem de arriscar quando a fortuna lhe sorri e de agir com prudência quando a sorte é adversa.

    Dilma Rousseff arriscou quando o vento soprava a favor. Teve ousadia de meados de 2011 ao segundo semestre de 2012, momento em que a situação internacional abriu uma brecha para modificar o binômio neoliberal dos juros altos e do câmbio flutuante, que vinha matando a indústria brasileira desde os anos 1990. Reconheça-se que, então, a presidente enfrentou interesses poderosos.

    No entanto, o resultado foi decepcionante. O fraquíssimo crescimento da economia em 2012 mostrou que alguma coisa falhara na equação. Muitas hipóteses diferentes tentam explicar o acontecido. Também tenho as minhas, mas por ora interessa constatar que, em face dos números divulgados na última quarta-feira pelo IBGE, tudo indica que 2013 vai em direção semelhante. Na entrevista que se seguiu ao anúncio, o ministro Mantega deu a entender que o governo entregou os pontos e nada mais pode fazer a respeito no curto prazo.

    Acrescente-se que a posição do Banco Central de elevar a taxa Selic até a inflação retornar à meta tende a prolongar a fraqueza da economia para 2014. Em outras palavras, o BC acendeu o sinal amarelo no que diz respeito à conjuntura do ano reeleitoral.

    Isso explica por que Dilma vem se tornando suave com aliados incômodos, como o líder do PMDB na Câmara, Eduardo Cunha, --a última façanha da bancada foi apoiar um pedido de CPI da Petrobras. A inédita suavidade presidencial se estendeu nesta semana ao presidente do Senado, Renan Calheiros, que se recusou a votar a MP 605, de redução da energia elétrica.

    À medida que o quadro econômico piora, a futura candidata fica obrigada a aumentar a extensão e a coesão das possíveis alianças eleitorais, pois não pode correr o risco de enfrentar o pleito em situação econômica ruim com uma base fragmentada. O mesmo motivo elucida a infinita tolerância de que é objeto a candidatura cavalo de troia de Eduardo Campos.

    Agora Gilberto Kassab veio também incorporar-se ao bloco dos que se aproximam sem garantir fidelidade. Caso algum inesperado vendaval afete o emprego e a renda da população pobre, esteios da candidatura oficial, haverá uma corrida para a oposição.

    Nos longos meses que faltam para o começo efetivo da campanha, muitos outros personagens do tipo ainda irão aparecer. A todos Dilma será obrigada a agradar e sorrir. Haja aparelho digestivo.

    andré singer

    É cientista político e professor da USP, onde se formou em ciências sociais e jornalismo. Foi porta-voz e secretário de Imprensa da Presidência no governo Lula.
    Escreve aos sábados.

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024