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    André Singer

    Rumo ao desconhecido

    30/08/2014 02h00

    Com a ascensão rápida de Marina Silva, confirmada pelo Datafolha e captada pelas pesquisas desta semana, teremos dois meses de alta indeterminação pela frente. As incógnitas que rondam a candidata, neste momento majoritária no segundo turno, tornarão volátil o cenário político e eleitoral até 26 de outubro. Relação com o agronegócio, programa social, base de apoio para governar, há muito em aberto na candidatura pessebista.

    Ao comprometer-se com a independência do Banco Central (BC), Marina traçou o perfil macroeconômico de um possível governo do PSB. Teremos juros altos, recessão bem mais que técnica, corte de gastos públicos e desemprego. Mas como seria possível encaminhar os problemas da população que tem renda familiar mensal (RFM) entre 2 e 5 salários mínimos e mora em grandes centros urbanos, cujo apoio a ex-senadora precisa consolidar para vencer?

    De acordo com o Ibope, Marina detém 31% das intenções de votos nesse segmento, encontrando-se empatada tecnicamente com Dilma Rousseff (33%). Como a vantagem de Dilma é nítida entre os mais pobres –sobretudo os que recebem até 1 salário mínimo de RFM (46% contra 23% da candidata ambientalista)–, o fiador da possível eleição de Marina será o eleitor de baixa renda que já superou os problemas da sobrevivência imediata, mas continua às voltas com grandes insatisfações.

    A lógica eleitoral indica que Marina vai acentuar promessas, como a realizada no debate da Band (26/8), de destinar 10% da receita da União para a saúde. Ocorre que as referidas propostas são incompatíveis com a orientação sinalizada pela independência do BC. É certo que as campanhas adversárias vão apontar a contradição, ainda que isso cause algum problema de definição para elas próprias.

    Outra via de ataque a Marina diz respeito à "nova política". A entrevista para o "Jornal Nacional" (27/8) deu o tom do que vem pela frente. A impossibilidade de explicar, ou condenar, o suposto caixa dois envolvido no avião em que Eduardo Campos viajava, deixou Marina com a resposta típica do que ela chama "velha política": por enquanto nada tenho a declarar e tudo será investigado. Casos do gênero vão pipocar, pois a candidata está, e estará cada vez mais, aliada a políticos tradicionais.

    Em que medida o eleitor prestará atenção e perceberá tais incongruências? Concluo, após duas décadas de estudos eleitorais, que, apesar de pouco informado, o cidadão médio capta o "cheiro" do que vem pela frente. O difícil é saber se, na hora H, preferirá correr o risco de decepcionar-se com Marina para tirar o PT do poder, ou se optará pela segurança da situação já conhecida, ainda que não animadora.

    avsinger@usp.br

    andré singer

    É cientista político e professor da USP, onde se formou em ciências sociais e jornalismo. Foi porta-voz e secretário de Imprensa da Presidência no governo Lula.
    Escreve aos sábados.

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