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    André Singer

    O nó do PT

    13/06/2015 02h00

    O quinto congresso do Partido dos Trabalhadores, que se encerra hoje, interessa não apenas aos militantes da estrela, mas ao Brasil inteiro. Mesmo o mais exacerbado antipetista, desde que democrata, deveria reconhecer o papel desempenhado pelo PT na construção institucional do país. A existência de agremiações competitivas e capazes de governar é indispensável para o funcionamento da democracia. A sigla fundada há 35 anos mostrou ter os dois atributos.

    Os desafios postos para os congressistas possuem a dimensão do tamanho alcançado pela organização. Os representantes das bases precisam desatar o nó formado pela confluência de três fatores superpostos. O pano de fundo é o cavalo de pau econômico decidido pela presidente Dilma Rousseff logo depois da reeleição, sem consultar o partido. Inspirada em 2003, Dilma não percebeu que, depois de 12 anos de lulismo, uma política ortodoxa não poderia mais ser atribuída à "herança maldita" do PSDB. Todo o amargo preço do ajuste antipopular vai cair no colo do próprio PT.

    O partido, por sua vez, não quis ver que a crise vinha emitindo sinais desde junho de 2013. As manifestações foram o apito da panela de pressão, e o fogo que a aquecia era a dificuldade em sustentar o crescimento. Quando Dilma foi eleita pela primeira vez, sabia-se que as reformas lentas do lulismo dependiam de 4% a 5% de elevação anual do PIB. Com 1% em 2012 (pela antiga metodologia), e sem horizonte de melhora, estava armado o impasse.

    O PT foi pego de surpresa pela dissonância entre o discurso de Dilma até 26 de outubro passado e as ações efetivas adotadas a partir do dia 27. Ao impacto das tesouradas, somou-se o desenrolar do grave escândalo de corrupção na Petrobras, o qual envolve diversos partidos, mas tem o PT no centro. Sem que a ferida do mensalão tivesse tempo sequer de começar a cicatrizar, aparece outro caso que abala a moral do antigo "partido da ética".

    Para completar, assumiu a presidência da Câmara dos Deputados um político conservador, frio e disposto a tudo para criar dificuldade aos petistas. A aprovação, de modo duvidoso após uma primeira derrota, do projeto que constitucionaliza a doação de empresas a partidos, oficializa o controle do poder econômico sobre as siglas. Como fica um partido fundado para expressar os interesses da classe trabalhadora em um sistema dominado por empresas?

    Será bom para a esquerda brasileira, e para a República, se os delegados reunidos na Bahia encontrarem caminhos para requalificar a relação com o governo, para tornar a máquina partidária independente das empresas e da corrupção e para enfrentar a onda conservadora que assola o seu principal aliado (PMDB). Há muito em jogo no congresso soteropolitano.

    andré singer

    É cientista político e professor da USP, onde se formou em ciências sociais e jornalismo. Foi porta-voz e secretário de Imprensa da Presidência no governo Lula.
    Escreve aos sábados.

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