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    André Singer

    Uma brisa

    21/11/2015 02h00

    A meteorologia política mostra que zonas de alta pressão se afastaram do chapadão central, o que faz prever um fim de primavera menos tórrido do que o seu início na capital brasileira. A menos que a sempre imprevisível Lava Jato tenha preparado lances teatrais nas próximas semanas, abre-se espaço não para resolver a crise, cuja extensão para 2016 é provável, mas ao menos para reequacionar os seus termos.

    A semana trouxe boas notícias ao governo. Conseguiu duas vitórias apertadas na Câmara; Eduardo Cunha foi obrigado a admitir que o impeachment fica para o ano que vem; o mercado reagiu de maneira positiva a ações do Executivo para reativar a economia –abertura para empréstimo aos Estados e apoio à produção de aço local — e, com isso, os juros de longo prazo caíram; Lula voltou a falar com a imprensa. Até o prefeito Fernando Haddad, cujo desempenho nas próximas eleições é decisivo para Dilma, foi bafejado pela possibilidade de obter recurso externo a ser usado em obras de drenagem e moradia em São Paulo.

    O desempenho da base aliada nas votações da semana —reajuste do judiciário e extensão da valorização do salário mínimo a todas as aposentadorias — mostra homeopática diluição do isolamento estabelecido na eleição para a presidência da Câmara em fevereiro, quando o candidato do Planalto teve apenas 136 votos. Agora, o palácio conseguiu 160 sufrágios para recusar uma espécie de abono aos aposentados, o que não é lá, digamos, muito popular.

    Nada disso, de per se, resolve a instabilidade deflagrada após a reeleição presidencial. Enquanto a recessão não for estancada, a popularidade de Dilma não vai se recuperar. Com alta rejeição, a luta para tirá-la do poder, seja por meio da confirmação por parte do Congresso de que houve pedaladas fiscais em 2014, seja pela apreciação das contas de campanha por parte do TSE, continuará vigorosa. Mas abre-se um interregno.

    Em suma, o nó górdio continua, só que Dilma ganhou precioso tempo para tentar desatá-lo. O documento do PMDB oferece um caminho. Trata-se de ponte para o liberalismo, tradição à qual o partido nunca se filiou, mas que agora perfila, ao que parece em busca de apoio nos meios empresariais.

    Em sentido oposto, reunidas outra vez em torno de programa comum, as centrais sindicais, entre elas a CUT e a Força, fazem chamamento para a mudança da política econômica e retomada do crescimento. Em iniciativa que também procura agregar o capital —responsável por parte decisiva dos investimentos necessários–, os sindicatos vão lançar nos próximos 15 dias o texto "Compromisso permanente pelo desenvolvimento". As classes se mexem. Espera-se que a política, apesar de muito abalada, seja capaz de lhes dar direção efetiva.

    andré singer

    É cientista político e professor da USP, onde se formou em ciências sociais e jornalismo. Foi porta-voz e secretário de Imprensa da Presidência no governo Lula.
    Escreve aos sábados.

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