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    André Singer

    São Paulo puniu o lulismo

    08/10/2016 02h00

    Fabio Braga - 2.out.2016/Folhapress
    SAO PAULO, SP, BRASIL, 02-10-2016 - O prefeito e candidato a reeleicao Fernando Haddad fala com a imprensaapos o final da apuracao em Sao Paulo (Foto: Fabio Braga/Folhapress, ELEICOES)
    Prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT) fala com a imprensa após resultado da eleição municipal

    Uma das teorias sobre comportamento eleitoral afirma que o votante vai às urnas para recompensar ou punir o governante de turno. De acordo com essa visão, o papel da oposição é passivo. A ela cabe apenas receber o sufrágio, caso o sentimento seja de punição.

    Embora o assunto requeira análise mais cuidadosa, à primeira vista foi o que aconteceu em São Paulo no último domingo (2). Só que, tudo indica, Fernando Haddad — o qual saiu-se melhor que o esperado, em face das circunstâncias — recebeu a pancada que o eleitor queria dar no segundo mandato de Dilma. O pleito paulistano pareceu-me a mais nacionalizada das disputas locais na cidade desde a redemocratização.

    Na lista de motivos para a vingança, ainda que a Lava Jato entre como um dos itens, a economia puxa a fila. Basta ver o voto da periferia, a qual prioriza, por razões óbvias, as condições materiais de vida. Entre os mais pobres, o atual prefeito estava em quarto lugar, com apenas 9% das intenções de voto na última pesquisa do Datafolha.

    Reforça a hipótese econômica o fato de que a atual gestão municipal termina sem denúncias importantes, deixando uma imagem genérica de lisura no trato do dinheiro público. É o que explica, por sinal, outro aspecto curioso: o bom desempenho relativo de Haddad entre as camadas médias, estas, sim, muito sensíveis ao tema da corrupção. Entre os mais ricos, o petista estava em segundo lugar, 17 pontos percentuais acima de Marta Suplicy (PMDB).

    No que diz respeito à avaliação específica da gestão paulistana, depois de uma violenta queda na época das manifestações de junho de 2013, a aprovação do prefeito começou a subir no ano seguinte. As ciclovias, um dos símbolos da gestão, estavam bem avaliadas, e parecia haver uma tendência à reconciliação entre a cidade e o seu gestor.

    Com o início da crise econômica nacional, entretanto, logo nos primeiros meses de 2015, a rejeição à prefeitura subiu de novo, voltando aos patamares anteriores. Assim, sem desconsiderar que possam existir fatores específicos, a curva de Haddad assemelha-se à de Dilma. Acredito que o descolamento do lulismo em relação à sua própria base social refletiu nas duas figuras escolhidas diretamente por Lula para cargos chave.

    Derrotas fazem parte do jogo democrático. Não se pode ganhar sempre. O problema é saber se houve um afastamento temporário ou um verdadeiro divórcio litigioso entre o lulismo e os mais pobres. Talvez Lula, ele mesmo, ainda detenha um capital haurido nos bons tempos da prosperidade. Resta ver se a Lava Jato deixará que ele o teste.

    *

    Não poderei estar com vocês no próximo sábado. Volto em 22/10.

    andré singer

    É cientista político e professor da USP, onde se formou em ciências sociais e jornalismo. Foi porta-voz e secretário de Imprensa da Presidência no governo Lula.
    Escreve aos sábados.

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