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    André Singer

    Alerta

    21/10/2017 02h00

    Sergio Lima/AFP
    Federal deputies celebrate during a session of the Constitution and Justice Commission in Brasilia, on October 18, 2017. A Brazilian congressional committee on Wednesday voted against making President Michel Temer stand trial on corruption charges. / AFP PHOTO / Sergio LIMA ORG XMIT: SLI
    Painel na CCJ da votação do parecer da segunda denúncia contra Temer

    Um dos maiores problemas da situação atual está em naturalizarmos absurdos e deixarmos de perceber o risco que encerram. Nesta semana, por exemplo, o Congresso em certa forma absolveu Michel Temer, na CCJ da Câmara, e Aécio Neves, no plenário do Senado. Ambos gravados por Joesley Batista em práticas inaceitáveis para um presidente e um senador da República.

    Não por acaso, quase a metade dos pares que inocentaram Aécio também é acusada na Lava Jato. As decisões tomadas pelos parlamentares visam a própria defesa. Indicam, também, que o rigor nas condenações congressuais só valia para o governo anterior e os que o sustentavam (com a exceção de Eduardo Cunha, cuja queda serviu de álibi para a derrubada do PT).

    A falta de legitimidade das resoluções, embora legais, deveria nos causar arrepio, pois desgastam a democracia na hora de sua maior fragilidade. A descrença nas instituições, por sua vez, vai irrigar um fértil terreno autoritário. Nada menos que 62% dos brasileiros entrevistados pelo Centro de Pesquisas Pew entre fevereiro e maio consideravam aceitável algum tipo de regime não democrático.

    Essa parcela da população é praticamente a mesma que, em outra pesquisa, coordenada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, declarava ser necessário ao país, mais do que leis ou planos políticos, "líderes valentes": 69%. Os que conhecem a metodologia do levantamento sabem que tal resposta indica um anseio por autoridade forte. A intenção de voto em Jair Bolsonaro, 17%, ainda deve estar encapsulada no setor do eleitorado que expressa simpatia à ditadura : 21%, segundo o Datafolha.

    Agora, a preferência pelo ex-capitão ocorre mais em camadas de maior escolaridade, que tendem a ter opinião consolidada sobre o assunto. O problema está em evitar que a simpatia ao militar da reserva chegue ao eleitorado de baixa renda, cuja propensão a buscar uma liderança que diminua o sufoco imposto pela recessão e pela criminalidade pode desaguar na opção pela mão firme de um líder autoritário.

    Em 1989, num quadro com algumas semelhanças, Fernando Collor cativou as camadas de menor renda. Só que, naquela época, a democracia estava em plena ascensão. Espero estar errado, mas sinto que as forças democráticas do país, em todos os quadrantes ideológicos, não entenderam o tamanho do perigo que corremos.

    *

    Com relação à última coluna, recebi de leitor atento a explicação de que o STF continuaria a considerar constitucional a suspensão de mandato pela corte, apenas tendo que ser referendada pelo Legislativo. Faço o registro, mas continuo a não encontrar tal artigo na Constituição.

    andré singer

    É cientista político e professor da USP, onde se formou em ciências sociais e jornalismo. Foi porta-voz e secretário de Imprensa da Presidência no governo Lula.
    Escreve aos sábados.

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