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    Antonio Delfim Netto

    Eficiência

    06/02/2013 03h30

    A alegria de todos os governos em aprovar projetos de singular visibilidade, mas de aparência gratuita, é incontrolável. Não se trata de refinarias que só amadurecem em 20 anos ou de hidrelétricas que não terminam em menos de 15 anos, com aumentos de custos avassaladores, em que a experiência mostra que são repetitivos e mais graves quando a administração é direta. E trágicos, quando resultantes de emendas parlamentares.

    Por maior que seja a boa vontade, não se encontra a realização de uma só ideia que tenha saído do papel e tenha sido entregue ao público no tempo aprazado e com custos ajustados de forma razoável. E praticamente todas terminam no Tribunal de Contas, ou nas delegacias de polícia...

    Esses fatos não se limitam a obras "físicas" --uma estrada, uma ponte, um porto, uma usina térmica ou hidrelétrica. Temos agora um exemplo surrealista: o Acordo Ortográfico, nascido de genitores duvidosos e colocado na "roda" em Lisboa, nos idos de 1990!

    Não tenho competência para avaliar se o acordo é uma necessidade e se vai estimular o enriquecimento linguístico ou o florescimento maior das já excelentes literaturas brasileira e portuguesa.

    O que desejo é chamar a atenção para o que ocorre quando os governos (do Brasil e de Portugal) são estimulados a "meter a mão" numa tarefa que deveria ser deixada às respectivas academias de letras. Quando estas (se isso for possível antes do fim do mundo) chegarem a um compromisso e publicarem, no ano de 20.. (estou hoje com irrefreável otimismo!), o "Vocabulário Ortográfico Universal da Língua Portuguesa", adeririam a ele, com o tempo, todos os Estados da comunidade lusófona (se o desejassem...).

    Vejam só o que diz o acordo de 1990: 1º) Até 1º/1/1993 os Estados signatários produzirão o vocabulário ortográfico comum; 2º) Em 1º/1/1994 ele entrará em vigor em todos eles.

    Como era de esperar, tudo isso era só encenação e conversa! Em setembro de 2008 (como nada tinha acontecido), o então presidente Lula assinou um decreto determinando que em 1º/1/2009 o acordo começaria a funcionar e que em 31/12/2012 as duas grafias seriam uniformizadas. Gastou-se um rio de dinheiro público (foi publicado um dicionário escolar e um vocabulário ortográfico, ajustou-se a escrita de livros, jornais etc.). Produziu-se apenas uma enorme confusão e uma bem-vinda barreira de críticas pertinentes.

    Felizmente, a presidente Dilma Rousseff em boa hora adiou (pena que não "sine die") mais uma vez, para 1º/1/2016 (depois de uma geração...), o "(Des)Acordo" de 1990! É o que resulta da ação dos governos quando eles insistem em meter a mão no que não devem.

    antonio delfim netto

    Ex-ministro da Fazenda (governos Costa e Silva e Médici), é economista e ex-deputado federal. Professor catedrático na Universidade
    de São Paulo.
    Escreve às quartas-feiras.

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