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    Antonio Delfim Netto

    Constituição

    09/10/2013 03h00

    Na última semana, comemoramos o primeiro quarto de século da Constituição de 1988. A maioria das análises ressaltou a excelência de suas cláusulas pétreas que asseguram os direitos do cidadão, em particular a sua mais plena liberdade de iniciativa, até de protestar, sob a proteção do Supremo Tribunal Federal, que tem se desincumbido bem da sua missão.

    Foi mais crítica em relação à organização do sistema produtivo, em que a Constituição estabelece um poder incumbente forte, capaz de garantir o bom funcionamento dos mercados e de amenizar seus conhecidos inconvenientes: suas tendências ínsitas ao aumento das desigualdades e ao excesso de flutuação.

    Olhadas mais de perto, as restrições não se referem propriamente ao "modelo", mas à forma com que ele vem sendo implementado e à indisposição do governo de empenhar-se em algumas reformas necessárias ao aumento da produtividade. Entre elas, sobressai o hospício a céu aberto que criou, principalmente por obra e arte dos Estados, um sistema tributário que nos rouba, anualmente, de 1% a 2% do PIB.

    No seu cerne, a Constituição de 1988 propõe a construção de uma sociedade civilizada que: 1º) quer uma República onde todos, inclusive o poder incumbente, estejam sujeitos à mesma lei; 2º) quer uma democracia, com eleições livres realizadas em períodos bem definidos, com apuração expedita e sem fraude; 3º) quer uma política social e econômica que aumente continuadamente a igualdade de oportunidades.

    É apenas natural, portanto, que ela proponha um utópico provimento pelo Estado de serviços de educação e saúde universais e gratuitos. Obviamente, eles serão pagos tributando toda a sociedade.

    Saúde e educação são investimentos civilizatórios em capital humano fundamentais para aumentar a igualdade de oportunidades, a coesão social e a aceleração do desenvolvimento. No Brasil, as duas áreas padecem, menos por falta de recursos e mais por uma lamentável deficiência de gestão.

    De 1988 a 2012, a taxa de analfabetismo caiu 55%; o número de alunos no ensino médio cresceu 250% (5,4% ao ano) e, no curso superior, 190% (4,6% ao ano). O número médio de anos da instrução brasileira tem tido um acréscimo, em média, de 2% ao ano. Nesse passo, precisaremos de duas décadas para nos igualarmos ao nível atual dos emergentes mais dinâmicos, quando eles já serão desenvolvidos.

    No campo da saúde, a mortalidade infantil caiu 70% e a expectativa de vida ao nascer aumentou oito anos. Melhoramos. Seguramente menos do que poderíamos ter feito com os mesmos recursos, se tivéssemos tido um pouco mais de confiança.

    antonio delfim netto

    Ex-ministro da Fazenda (governos Costa e Silva e Médici), é economista e ex-deputado federal. Professor catedrático na Universidade
    de São Paulo.
    Escreve às quartas-feiras.

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