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    Antonio Delfim Netto

    Invexp

    03/09/2014 02h00

    "Caiu a ficha". É agora geral o reconhecimento que a causa fundamental da progressiva redução da taxa de crescimento do PIB foi a pouca atenção dada à cuidadosa destruição da capacidade competitiva da indústria manufatureira nacional, consequência do uso da taxa de câmbio como instrumento de controle da inflação em substituição às políticas fiscal e monetária.

    Entre 2002 e 2007, depois da correção da supervalorização cambial de 1999, o saldo das exportações de manufaturados, que havia sido negativo em US$ 25,3 bilhões entre 1996-98, transformou-se no superávit de US$ 138,8 bilhões, o que aumentou a demanda de manufaturados brasileiros no mesmo valor.

    Em 2007, a taxa nominal de câmbio, que andara em torno de 2,30 R$/US$ nos dois anos anteriores, cai para 1,95 R$/US$ (uma valorização de 15%, com uma inflação de 6%) e, a partir daí, com uma política cambial errática, reduziu-se a 1,67 R$/US$ em 2011 (com uma inflação acumulada de 25%!).

    O resultado dessa aventura foi o deficit acumulado do saldo comercial dos manufaturados de US$ 236,0 bilhões entre 2008 e 2014. Em poucas palavras: de 2002 a 2014, a supervalorização "roubou" nada menos do que US$ 370 bilhões de demanda interna e externa da indústria nacional.

    Em 2009, no auge da crise mundial, a taxa de câmbio se desvalorizou 9%, para valorizar-se 14% em 2010-11 e voltar a desvalorizar-se lentamente de 2012 até hoje, com a taxa de 2,30 R$/US$. Notemos que é a mesma taxa de 2005/06, enquanto a inflação total no período foi de 69,2%!

    É agora evidente o que sempre deveria ter sido. Num processo de desenvolvimento econômico saudável há uma cointegração entre os três setores: agricultura, indústria e serviços. Depois da grave crise de 2009, nossa recuperação foi rápida, o problema é que dado às circunstâncias anteriores, a produção industrial estagnou, reduzindo os investimentos no setor e o crescimento do PIB.

    O desconforto causado pela baixa performance da indústria não é a única causa da murcha do crescimento.

    A falta de previsibilidade produzida por intervenções bem intencionadas, particularmente no comportamento do câmbio, que é o preço relativo mais importante da economia, foi devastadora. Mais importantes foram as dificuldades de comunicação entre o governo e o setor empresarial, dominada por preconceitos recíprocos que reduziram o nível do investimento privado.

    A combinação da redução da demanda da indústria (ocupada pela importação subsidiada) com a redução dos investimentos privados foi mortal para o crescimento do PIB. Não vamos voltar a crescer sem enfrentar com disposição e inteligência esses dois obstáculos.

    ideias.consult@uol.com.br

    antonio delfim netto

    Ex-ministro da Fazenda (governos Costa e Silva e Médici), é economista e ex-deputado federal. Professor catedrático na Universidade
    de São Paulo.
    Escreve às quartas-feiras.

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