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    Antonio Delfim Netto

    Primavera

    25/02/2015 02h00

    Quem foi premiado com uma longa experiência pública com o setor privado (financeiro e real) sabe 1º) que, para o empresário, o nível de volatilidade do seu humor é proporcional à perspectiva de flutuação da sua conta bancária, o que o torna um curto-prazista e 2º) que a inquietação que ataca os trabalhadores é a perspectiva de aumento do nível de desemprego.

    As dificuldades de manter a coesão de suas famílias e sua integração na empresa, a ausência de reservas de poupança, o nível de seu endividamento e a precariedade do auxílio ao desemprego explicam a angústia por resultados imediatos, o que os torna, também, curto-prazistas.

    Esses fatos explicam por que o "ajuste", mesmo quando sabidamente indispensável para que num prazo mais longo se recupere o aumento da taxa de crescimento do PIB e a continuidade da inclusão social, é frequentemente retardado e sempre sujeito às vicissitudes do período eleitoral.

    É porque o seu sucesso depende essencialmente da arte política de convencer a sociedade que o "ajuste" será o mais inteligente possível (minimiza os seus custos econômicos e sociais) e o mais equânime (distribui os custos proporcionalmente a quem pode e deve pagá-los) para maximizar a sua moralidade.

    Como é absolutamente evidente, as condições necessárias para que o "ajuste" seja bem-sucedido são a credibilidade e "convicção" do poder incumbente, a qualidade do programa e a reconhecida competência dos encarregados de sua execução. Não há condição suficiente para garantir o seu sucesso, a não ser, talvez, a sorte...

    Por maiores e mais preconceituosas que sejam as desconfianças de parte da sociedade em relação à presidente Dilma, é preciso reconhecer a sua coragem. Diante das dificuldades de 2011-2014, ela escolheu uma nova política econômica e chamou os ministros Joaquim Levy, Nelson Barbosa, Armando Monteiro e Kátia Abreu para executá-la.

    Trata-se de um programa razoável dentro das limitações políticas vigentes, que, sem diminuir a ênfase na igualdade de oportunidades, apresenta um caminho realista para nos aproximar da administração "normal" dos países mais bem- sucedidos.

    Mas ele não será percorrido em menos de dois anos.

    Se a sociedade não for convencida politicamente dos benefícios da troca de algum sacrifício no curto prazo pelas condições de crescimento mais robusto e equilibrado no futuro e não tiver a paciência de esperar os seus frutos, o curto-prazismo acabará prevalecendo. E, quando a primavera chegar, em setembro, se eu conheço os empresários e os trabalhadores, nós os veremos pedindo a troca do programa e dos ministros...

    antonio delfim netto

    Ex-ministro da Fazenda (governos Costa e Silva e Médici), é economista e ex-deputado federal. Professor catedrático na Universidade
    de São Paulo.
    Escreve às quartas-feiras.

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