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    Antonio Delfim Netto

    O impossível

    18/11/2015 02h00

    No País das Maravilhas ao qual Alice foi levada no seu sonho, é normal acreditar em coisas impossíveis. Diante do seu ceticismo, a Rainha ensinou-lhe que era, apenas, uma questão de prática. No Brasil das Maravilhas, também!

    Basta ter alguma prática e alguma coragem para saber que nada é mais natural do que o efeito anteceder à sua causa, como afirmam eminentes líderes partidários.

    É evidente que só um miserável neoliberal defensor da direita troglodita pode recusar-se a aceitar o fato "descoberto" pela esquerda infantil: foi Joaquim Levy, o famoso "mão de tesoura", quem produziu, em dezembro de 2014, com sua política de ajuste (nunca atendida!) a recessão econômica que se iniciara em abril de 2014. Ela reduziu a zero o crescimento daquele ano.

    Continuou a aprofundar-se e vai reduzi-lo em 3% em 2015 e já ameaça mais uma redução de 2% em 2016.

    A situação fiscal é difícil. Mais grave, entretanto, é a perspectiva de que ela pode piorar se a presidente não recuperar o seu protagonismo e coordenar a precária maioria de que ainda dispõe no Legislativo para:

    1º) Aprovar as mudanças constitucionais e medidas infraconstitucionais que eliminem o deficit fiscal estrutural embutido na Constituição de 1988. Nos últimos 30 anos, ele tem sido piorado pela concessão de privilégios corporativos a grupos próximos do poder.

    É preciso reconhecer que estão longe de aumentar a igualdade de oportunidades ou mitigar as necessidades dos menos favorecidos com programas bem focados e condicionalidades adequadas, para ajudá-los a conquistar, com seu esforço, a cidadania.

    São, portanto, potencialmente injustos. Todos os programas, mesmo os mais bem sucedidos (como o Bolsa Família) precisam ser permanentemente avaliados pela comparação de seus custos com seus benefícios e permanentemente escrutinizados para a eliminação do "parasitismo", a doença mortal que consome todo programa permanente.

    2º) Cria as condições de credibilidade sobre a política fiscal que garanta a estabilização (e posteriormente a regressão) da relação dívida bruta/PIB, condição necessária para dar maior poder à política monetária e reduzir a "expectativa de inflação" e a taxa de juros.

    3º) Construir um ambiente de negócio mais amigável para o setor privado e um sistema de concessões das obras de infraestrutura que restabeleça esperança da volta do desenvolvimento, o que ressuscitará o investimento que o produz.

    Sem a perspectiva de que vamos crescer, nada acontecerá, nem mesmo o equilíbrio fiscal...

    antonio delfim netto

    Ex-ministro da Fazenda (governos Costa e Silva e Médici), é economista e ex-deputado federal. Professor catedrático na Universidade
    de São Paulo.
    Escreve às quartas-feiras.

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