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    Antonio Delfim Netto

    Oxigenação

    25/11/2015 02h00

    A última semana parece ter revelado uma ligeira oxigenação do governo, particularmente da presidente.

    Com imenso atraso, ela sinalizou que agora dá muito peso à opinião do ministro Levy e este, com não menos atraso, que sua preocupação é o crescimento. Em resposta ao incontornável "disse-que-me-disse", que pragueja todo Palácio e usa o "off" para disseminá-lo e dar alegria ao "mercado financeiro perfeito", Dilma foi enxuta: "Levy fica!".

    Outro sinal interessante veio da longa entrevista que Lula concedeu à GloboNews. Negou que esteja ligado à campanha "Fora, Levy", promovida por notáveis aloprados do PT. No final do dia, a Bolsa subiu, a curva de juros melhorou e o real se valorizou...

    O resultado confirma que o mercado responde mais ao que não sabe do que aos fatos.

    Talvez sejam resultados da crença de que a reforma ministerial organizou a "base" política do governo, constituída por dez partidos, com 324 deputados, o suficiente para aprovar qualquer reforma constitucional na Câmara, o que está longe da verdade. Não há relação de causa e efeito, mas é cada vez mais evidente que uma esperta facção do PMDB –aproveitando-se das circunstâncias– aplicou um 171 na presidente: vendeu-lhe o que não tem para entregar, como se verificou na aceitação dos corretos vetos a dois projetos teratológicos, um dos quais nem sequer foi aprovado no plenário da Câmara.

    A aceitação dos vetos aos aumentos do Judiciário e à valorização do salário mínimo dos aposentados deveria nos dar mais preocupação do que tranquilidade. Por quê? Porque dos 324 deputados supostamente da base, menos de 30% (nas duas votações) apoiaram o governo! Para a rejeição dos vetos na Câmara, são necessários 256 votos (80% da "base"), mas eles não passaram de 132 (42% da "base" na votação do aumento do Judiciário) e 160 (49% da "base" na dos aposentados).

    No voto do Judiciário foi por um triz: a "oposição" ao governo (a "traição" da base mais a "oposição") obteve 251. Com mais 6 votos a tragédia estaria feita: o veto teria sido rejeitado! Os vetos só foram rejeitados porque deixaram de votar (faltaram ou obstruíram) no caso do Judiciário, 129 deputados e no caso dos aposentados, 141. Um sinal lamentável.

    O governo avançou com a fuga da sua base! Na "soi-disant" elite iluminada, surpreendeu o comportamento do PSDB: quatro quintos dos seus deputados votaram, irresponsavelmente, convictos, "no quanto pior, melhor"...

    Dilma só pode ressuscitar o seu protagonismo com inteligente e competente reorganização política que dê solidez à sua "base" e lhe permita encaminhar as reformas constitucionais de que o Brasil carece para voltar a ser "normal"...

    antonio delfim netto

    Ex-ministro da Fazenda (governos Costa e Silva e Médici), é economista e ex-deputado federal. Professor catedrático na Universidade
    de São Paulo.
    Escreve às quartas-feiras.

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