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    Antonio Delfim Netto

    Populismo

    13/04/2016 02h00

    Em respeito aos meus eventuais leitores, peço permissão à Folha, que me honra com este espaço há 30 anos, para lembrá-los que, no leilão da hidroelétrica de Belo Monte, em abril de 2010, haveria um único concorrente.

    Trabalhei para ajudar a promover um segundo consórcio para que ele fosse mais transparente, competitivo e vencesse o menor preço, o que daria maior eficiência ao projeto.

    Foi o que de fato aconteceu. Recebi honorários por serviço prestado, materialmente comprovado pelo resultado do leilão, através de contratos registrados e impostos devidamente recolhidos.

    O profundo desequilíbrio fiscal estrutural que se abateu sobre a administração social e econômica do Brasil é apenas mais um caso das consequências do "curto-prazismo" que costuma dominar os países que nos momentos de expansão adotam políticas laxistas de aumento das despesas permanentes.

    A história mostra que, mais dia menos dia, quando a conjuntura volta ao "normal", o país defronta-se com um impasse social.

    O governo, descuidado na maré alta, redistribui pelo aumento do imposto o que já era produzido, ou distribui – graças a um presente externo acidental (ganhos nas relações de troca), ou tomando empréstimos internos e externos (que devem ser servidos no futuro com juros). Na maré baixa tudo será direito "adquirido"...

    Um exemplo disso é dado numa exposição de Jacques Necker, um hábil financista, que se opunha ao extremo liberalismo de Turgot.

    Foi ministro das Finanças da França em 1777 (e depois, em 1788) quando a situação financeira do reino caminhava para a insolvabilidade. Em 1785 (às vésperas da desintegração e na porta da Revolução Francesa, que estourou em 1789) escreveu:

    "Enfim, quando uma imensa massa de dívida pública, ou seja, de antigas liberalidades convertidas em vantagens pecuniárias, acrescem aos dispêndios inúteis, injustos e exagerados do tempo presente, a nação perde a noção de proporção entre o sacrifício que dela se exige e as despesas que parecem necessárias ao bem do Estado."

    E continua: "Nesse momento, a desconfiança e o ódio à fiscalidade tornam absolutamente impossível entender as nobres relações que deveriam existir entre o tesouro e o interesse comum da sociedade".

    Qualquer semelhança entre a advertência de Necker e a profunda desintegração estrutural das finanças públicas que está inscrita na Constituição de 1988, pronta para cair no colo de qualquer governo tão logo políticas internas equivocadas, ou situações externas fora de seu controle levassem à recessão, não é mera coincidência...

    ideias.consult@uol.com.br

    antonio delfim netto

    Ex-ministro da Fazenda (governos Costa e Silva e Médici), é economista e ex-deputado federal. Professor catedrático na Universidade
    de São Paulo.
    Escreve às quartas-feiras.

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