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    Antonio Delfim Netto

    Comece já

    27/04/2016 02h00

    Todos ficamos chocados e perplexos diante do lamentável espetáculo televisivo do último dia 17 de abril. Era difícil acreditar no que se via. Mais difícil ainda, reconhecer que cada um de nós era responsável por ter entregue à Câmara algum daqueles senhores.

    E, no entanto, nenhum deles — nem o mais circunspecto e sério, nem o mais escrachado provocador — estava lá sem que muitos de nós lhe tivéssemos dado nosso voto. Não sabemos quantos, mas certamente a esmagadora maioria dos espectadores não sabia em quem votou! É compreensível.

    Alguns defeitos graves do nosso sistema eleitoral: as coalizões partidárias (na qual vota-se em A e se elege X) e o gigantismo dos distritos eleitorais (as grandes cidades e os Estados), dispersam os votos, apagam a memória do eleitor e o distanciam completamente do eleito.

    É grave erro pensar que a Câmara é uma amostra aleatória não viesada da sociedade brasileira. Não! Ela é uma amostra viesada produzida pela estratificação do sistema de escolha a favor de quem dispõe de mais recursos e suporte institucional: o poder político eventual, o poder financeiro, os sindicatos, as corporações, as igrejas e... o crime.

    É importante insistir no fato de que o sufrágio universal que empodera igualmente todo cidadão, independentemente do seu patrimônio, foi o grande instrumento civilizador do capitalismo quando o aumento da produtividade levou à separação entre o capital e o trabalho.

    A pressão da organização dos trabalhadores com o uso de partidos políticos mitigou os horrores do século 19. Mas a eficiência do sufrágio universal está ligada à redução sistemática dos custos das campanhas eleitorais e à relação responsável e direta entre o eleitor e o beneficiário do voto.

    Isso exige o estrito controle da natureza do seu financiamento e algum mecanismo de eleição distrital. Esta constrange o deputado eleito em dois sentidos: 1º) ele e sua família têm que viver no distrito sob os olhos vigilantes de seus eleitores. Seu filho vai à escola e sua esposa ao salão de beleza do distrito 2º) se houver qualquer desvio de conduta é possível interromper o seu mandato e eleger outro para terminá-lo.

    Precisamos de paciência e coragem para moderar nossa decepção! Estamos aprendendo. É hora de enfrentar o problema. Comecemos já. Na próxima eleição entreguemos nossos votos apenas aos candidatos do "nosso" distrito: que residam no nosso bairro ou no seu entorno imediato, se for vereador; ou na nossa cidade e seu entorno, se deputado. Apenas àqueles que nos contatarem diretamente e nos convencerem que merecem nossa confiança.

    ideias.consult@uol.com.br

    antonio delfim netto

    Ex-ministro da Fazenda (governos Costa e Silva e Médici), é economista e ex-deputado federal. Professor catedrático na Universidade
    de São Paulo.
    Escreve às quartas-feiras.

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