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    Antonio Delfim Netto

    STF decidirá sobre medida que revela abuso do funcionalismo

    03/05/2017 02h00

    Pedro Ladeira-19.dez.2016/Folhapress
    BRASILIA, DF, BRASIL, 19-12-2016, 18h00: Coletiva de imprensa do presidente do TSE, ministro Gilmar Mendes para falar do balanço da justiça eleitoral no ano. Ele estava acompanhado do secretário de fazenda Jorge Rachid, que falou da parceria com o TSE no cruzamento de dados de doadores eleitorais para ajudar na identificação de fraudes. Na sede do TSE. (Foto: Pedro Ladeira/Folhapress, PODER)
    O ministro do STF Gilmar Mendes

    Em breve, o plenário do Supremo Tribunal Federal terá de decidir sobre uma questão tão delicada quanto escandalosa. Revela um dos abusos que poluíram todas as esferas da administração pública desde que a remuneração dos seus funcionários deixou de ser coordenada por um órgão central, como aconteceu com o DASP durante mais de meio século!

    Em 2003, o presidente Lula sancionou a lei 10.698, que fixou um aumento fixo de R$ 59,87 para todos os funcionários públicos civis da administração federal direta, indireta, autárquica e funcional. Não podia haver determinação mais clara: tratava-se de um aumento absoluto, que se aplicaria a qualquer funcionário, não importando o nível da sua remuneração.

    A invencível hermenêutica "criativa" entrou em ação. A lei permitiria uma interpretação mais "justa". De fato, como é possível aceitar "a óbvia injustiça" do aumento para quem recebe R$ 1.000 ser de 6% e, para o desprotegido funcionário que embolsa R$ 40.000, de "apenas" 0,0015%? Ainda que pareça incrível, corrigir essa "injustiça" foi a decisão dos órgãos do Judiciário (STJ, STM e TST).

    O que fizeram? Verificaram a remuneração mínima do seu funcionalismo (qualquer coisa como R$ 452,53) e calcularam qual seria o percentual do seu aumento pela lei (59,87/452,53 = 0,1323), ou seja, de 13,23%.

    Logo, a "hermenêutica logarítmica" exigiria o aumento de salários em 13,23%. A aritmética está certa, mas o contorcionismo hermenêutico da interpretação é claramente um escândalo! Como de costume na administração pública, tal decisão atingiu, retroativamente, todo o funcionalismo, sempre pronto a exigir o direito "mal" adquirido da falsa isonomia na diversidade! Tal resultado é, em parte, o produto da temeridade de dar autonomia administrativa e financeira a quem não precisa cuidar do caixa do Tesouro.

    A boa notícia é que, em maio de 2016, a Segunda Turma do STF suspendeu, por unanimidade, o reajuste dos servidores da Justiça do Trabalho, mas isso não esmoreceu o "justo furor reivindicatório".

    No próximo julgamento no pleno, espera-se que o ilustre ministro Gilmar Mendes proponha uma súmula vinculante do STF que atingirá toda a administração pública. Todos esperamos que recolha também a unanimidade dos votos! Não se sabe o custo da "generosidade", mas, certamente, é de algumas dezenas de bilhões, que fazem falta aos investimentos em infraestrutura, saúde e educação, sem os quais não há (nem haverá) desenvolvimento inclusivo.

    Passou da hora de voltarmos a um órgão centralizado, coordenador de uma política salarial única para o funcionalismo, e de pôr fim à "farra da cascata" que empesteou o setor a partir de 1985.

    antonio delfim netto

    Ex-ministro da Fazenda (governos Costa e Silva e Médici), é economista e ex-deputado federal. Professor catedrático na Universidade
    de São Paulo.
    Escreve às quartas-feiras.

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