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    Antonio Prata

    Três soluções para São Paulo

    29/12/2013 03h00

    Eis que, aos 44 minutos do segundo semestre, Deus já olhando o relógio para apitar o fim da duomilésima décima terceira volta da Terra em torno do Sol, o pessoal começa a pensar em suas resoluções de ano novo: largar o cigarro, entrar num pilates, sair do Twitter, ler "Em Busca do Tempo Perdido", e por aí vai —ou não vai, dependendo da força de vontade de cada um. Eu também tenho uma lista, mas, apesar de estorvá-los tantas vezes com picuinhas da minha irrisória existência, desta vez resolvi ser menos egocêntrico, alargando a circunferência do meu umbigo até atingir o diâmetro do Rodoanel: compartilho aqui, nesta coluna cidadã, algumas ideias que me ocorreram nos últimos 12 meses para transformar São Paulo numa cidade mais humana. Lá vai.

    Cauterização - Em julho, fui a Chicago. Sem dúvida, a metrópole mais agradável que já conheci. Os arranha-céus ficam todos no centro, moderno e imponente; ao norte e ao sul, bairros residenciais, com casas, prédios baixos e ruas arborizadas. Como a cidade beira o lago Michigan, há em toda a sua extensão uma espécie de aterro do Flamengo, comprido como o Chile. No verão, crianças patinam pela ciclovia, aposentados deitam-se na grama: nas praias lacustres, mulheres fazem topless; por uns momentos, o brasileiro se esquece da vida e acha que o mundo é um lugar justo e bom.

    Qual o segredo de Chicago? O segredo, amigo, é que a cidade pegou fogo em 1871: eles tiveram que reconstruir tudinho, do zero. Minha proposta é simples: a gente vai pra serra da Cantareira, leva um piquenique, uns binóculos e incendeia SP. Quando o fogo acabar, voltamos pra reerguer —ORGANIZADAMENTE.

    Elevados - Talvez o leitor ache a solução anterior um tanto radical. Ok. Aqui vai meu segundo plano para SP, mais comedido. Espera-se um desses congestionamentos monstro, de 300 km. Quando estiver aquele murundu, abandonamos os carros: desligamos os motores, tiramos as fitinhas do Bonfim dos retrovisores e vamos andando pra casa. Aí, basta aterrar a teia metálica e começar de novo, dois metros acima, planejando faixas de ônibus, ciclovias, bondes, riquixás, o que quisermos. A solução não só elimina uma das maiores chagas paulistanas (o trânsito) como gera empregos e dinheiro: aterrar inteiramente a nossa malha urbana e produzir novos veículos fará as duas pernas mancas da economia correrem como as de um Forrest Gump.

    Simbora, macacada - A terceira solução não é bem uma solução, mas uma desistência. Quem disse que a gente precisa morar aqui? Vamos comprar um bom pedaço de terra, sei lá, em Mato Grosso, e construir uma cidade nova, do jeito que quisermos. Podemos chamar aqueles arquitetos suíços do Ninho de Pássaro, o Paulo Mendes da Rocha ou qualquer um dos excelentes escritórios brasileiros. Quando a Nova São Paulo estiver pronta, a gente se muda. (Vai rolar um pouco de trânsito na saída, mas será o último.) A cidade antiga a gente demole, aterra e dá pros mato-grossenses, em troca do nosso terreno. De Perus a Marsilac, do Itaim Paulista ao Capão, só se verá soja. Sugiro deixarmos de pé apenas o Borba Gato, como um espantalho, uma lembrança do horror e um aviso para que a história não se repita.

    Feliz 2014 a todos. Nos vemos domingo que vem —na Marginal.

    antonio prata

    É escritor. Publicou livros de contos e crônicas, entre eles 'Meio Intelectual, Meio de Esquerda' (editora 34).
    Escreve aos domingos.

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