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    Benjamin Steinbruch

    Falso problema

    18/06/2013 03h00

    Está na moda criticar a opção brasileira pelo Mercosul.

    Sem dúvida, esse bloco comercial enfrenta problemas, embora não esteja "em coma", como chegou a dizer um articulista.

    Há uma crise de confiança entre os países-membros, muitas divergências comerciais envolvem os dois líderes -Brasil e Argentina- e falta consenso para o ingresso efetivo da Venezuela no grupo, fato que levou à suspensão temporária da participação do Paraguai na organização.

    Tudo isso é verdade, mas alguns críticos que sugerem ao Brasil abandonar de vez a união comercial do Sul do continente deveriam primeiro observar alguns números.

    Nos últimos dez anos, as exportações do Brasil para os países do Mercosul somaram US$ 169 bilhões. Já as importações totalizaram US$ 123 bilhões, apurando-se, portanto, um superavit nada desprezível de US$ 46 bilhões. Esse saldo é muito maior do que o obtido com os Estados Unidos, de apenas US$ 17,8 bilhões no período. Com a União Europeia, o superavit foi maior, de US$ 71,6 bilhões.

    Observe-se, porém, que 91% do total das exportações brasileiras para o Mercosul nesses dez anos, ou US$ 154 bilhões, foram de produtos manufaturados, aqueles que incluem maior valor agregado. Os países do bloco, portanto, são grandes absorvedores de produtos industriais brasileiros.

    Para avaliar se esse valor é expressivo, pode-se tomar como referência, novamente, a pauta de exportações para a União Europeia e os EUA. Nenhum dos dois blocos, apesar de seu porte econômico, consegue superar o Mercosul quando se olha para o comércio de manufaturados. A UE importou do Brasil, nos últimos dez anos, US$ 137,9 bilhões em manufaturas. Os EUA, US$ 138,7 bilhões.

    Os dois blocos desenvolvidos são grandes importadores de matérias-primas brasileiras, sejam commodities agrícolas ou industriais. Mas não colaboram tanto quanto o Mercosul no resultado comercial na área de manufaturas, a mais cobiçada por qualquer grande país exportador.

    O relacionamento comercial brasileiro tem sido, portanto, muito vantajoso com o Mercosul.

    Críticos certamente argumentarão que os resultados desfavoráveis na venda de manufaturas à UE e aos EUA decorrem justamente da escolha equivocada feita pelo Brasil ao dar prioridade ao bloco regional. Em razão disso e pelas próprias limitações impostas por normas do Mercosul, o país teria deixado de lado as articulações comerciais com os dois outros blocos.

    Essa observação é em parte verdadeira. Mas isso não quer dizer que seja sensato para o Brasil pensar em abandonar um mercado do tamanho do Mercosul.

    É difícil encontrar alguém bem informado que apoie incondicionalmente o sistema político atual de Argentina e Venezuela. Mas não quero -e também acho que não devo- avançar em juízos de valor sobre os governos dos dois países.

    É lamentável, porém, que opiniões favoráveis ao abandono do Mercosul se apoiem em razões ideológicas que levem em conta o comportamento conjuntural das atuais administrações desses países. Governos passam e os países ficam e, nessas condições, não faz sentido para o Brasil abandonar posições comerciais estabelecidas em duas grandes economias da
    América do Sul por problemas passageiros.

    É fato que esses países vizinhos são dois grandes mercados naturais para os produtos industriais brasileiros e representam uma oportunidade de negócios que não pode ser subestimada.

    Na semana passada, a Fiesp concluiu o documento "Agenda para a Integração Externa", que aborda esse tema com a necessária sensatez.

    Em um relatório de 19 páginas, sustenta que o Mercosul é um "falso problema", porque a participação do Brasil nessa entidade regional não impede o país de realizar acordos preferenciais de comércio.

    A ideia é que o Brasil lidere uma ação, dentro do bloco, para a negociação desses acordos. Para isso, seria necessário reformar o Mercosul e flexibilizar algumas de suas regras e não desmontar o bloco.

    O documento da Fiesp não se restringe ao Mercosul. Propõe um novo caminho para promover a competitividade do Brasil por meio da integração econômica com o mundo. Tudo isso sem radicalismos, com aprofundamento das parcerias já existentes e construção de novas.

    benjamin steinbruch

    É empresário, diretor-presidente da CSN, presidente do conselho de administração e 1º vice-presidente da Fiesp. Escreve às terças, a
    cada duas semanas.

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