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    Benjamin Steinbruch

    Xô, pessimismo

    30/07/2013 03h00

    A pior coisa que pode acontecer a uma pessoa, a uma empresa ou a um país é se deixar levar por ondas de pessimismo. E o Brasil corre esse risco neste momento.

    Se levarmos a sério discursos de alguns analistas, o país estaria à beira de uma hecatombe econômica e política.

    A inflação estaria perigosamente descontrolada; a atividade econômica, no caminho inevitável da recessão; as contas públicas, totalmente desarrumadas; as contas externas, no rumo do default; a corrupção, em ritmo desenfreado em todas as esferas públicas e privadas.

    Temos efetivamente problemas com inflação, atividade econômica, contas públicas, contas externas, corrupção e em muitas outras áreas. Mas só pessoas impregnadas por pessimismo doentio ou mal intencionadas podem considerar esses problemas como insuperáveis.

    A inflação de fato subiu, ultrapassou a teto da meta de 6,5% ao ano. Foi puxada pela elevação dos preços dos alimentos, impulso que já passou. O último dado do IPCA-15 mostrou que estamos próximos da inflação zero, com possibilidade até de deflação no índice oficial de julho, agora sob influência da queda dos custos de alimentos e transportes.

    Isso não significa que acabaram as preocupações com a inflação, até porque os preços dos serviços continuam em alta e o efeito câmbio pode impactar preços neste segundo semestre.
    Mas também não é o caso de propagar a ideia de que está de volta o velho dragão dos tempos da hiperinflação.

    A atividade econômica está fraca, muito aquém do desejável. A indústria, principalmente, muito prejudicada pela concorrência das importações, reduziu investimentos. Mas o país não segue a rota inevitável da recessão.

    Em artigo recente, o economista Francisco Lopes mostrou que os dados trimestrais do IBC-Br do Banco Central indicam uma aceleração da economia, em ritmo anual de crescimento próximo de 4%.

    Os gastos do governo preocupam, especialmente porque eles são pouco direcionados para investimentos. Mas o deficit está longe da calamidade pública. O deficit nominal, indicador usado em todo o mundo, é inferior a 3% do PIB, índice que daria ao Brasil uma condecoração se estivesse na União Europeia.

    Na área externa, o déficit nas transações correntes cresceu para US$ 43 bilhões no primeiro semestre, nível muito acima dos US$ 25 bilhões do mesmo período do ano passado. Mas o ingresso de investimentos diretos, que havia caído, voltou a aumentar e atingiu US$ 7,17 bilhões em junho. E o país tem gordas reservas de US$ 370 bilhões para qualquer eventualidade.

    A corrupção é uma epidemia no país há muito tempo. Eu era menino quando surgiu Jânio Quadros com o jingle "varre, varre vassourinha/ varre, varre a bandalheira/ que o povo está cansado de sofrer dessa maneira". O fato é que a corrupção nunca foi varrida e certamente hoje é maior que na época do Jânio.

    Varrer a corrupção é talvez uma das mais importantes razões pelas quais as massas foram às ruas em junho. Não quero ter a pretensão de interpretar a voz dos manifestantes, algo que os sociólogos podem fazer muito melhor. Mas foi possível observar a ausência de cartazes sobre deficit público, inflação, desaquecimento e desemprego.

    Eis um ponto importantíssimo. O mundo está em crise profunda desde 2008, há desemprego por toda a parte e, nesses cinco anos, o Brasil criou 9,9 milhões de empregos formais. No mês passado, foram mais 124 mil vagas, informação que o pessimismo conseguiu divulgar de forma negativa. Para o ano, a previsão é de 1,4 milhão de novas vagas.

    Imagino, portanto, que as ruas estão pedindo um novo salto de qualidade ao país. Beneficiadas pelos avanços das últimas duas décadas, reclamam por infraestrutura, educação, saúde e combate à corrupção.

    As ruas estão certas e as manifestações, excluídas naturalmente as que descambam para o vandalismo e a violência, devem ser objeto de comemoração. Não podem ser usadas para alimentar pessimismo que espalha desânimo, inibe investimentos empresariais e crescimento da economia.

    Nem otimismo ingênuo, nem pessimismo doentio. Essa seria uma boa norma de conduta para todos os que torcem pelo Brasil e batalham pela melhoria de vida dos brasileiros.

    benjamin steinbruch

    É empresário, diretor-presidente da CSN, presidente do conselho de administração e 1º vice-presidente da Fiesp. Escreve às terças, a
    cada duas semanas.

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