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    Benjamin Steinbruch

    Milagre

    11/03/2014 03h00

    O diagnóstico de alguns economistas, ao analisar as razões do baixo crescimento do Brasil, coloca entre as principais razões dessa tendência um fenômeno que chamam de "reprimarização econômica".

    De fato, o aumento do peso do setor primário na atividade pode ser facilmente observado. A indústria perde participação no PIB desde 1985, quando atingiu 27,5%, caindo hoje para algo em torno de 13%. O número de pessoas ocupadas na indústria era, no ano passado, praticamente o mesmo do de 2001.

    É usual a observação de que a indústria regrediu ao nível pré-JK, uma referência ao período em que o presidente Juscelino Kubitschek elaborou e lançou o Plano de Metas, que deu grande impulso à industrialização do país. Em 1956, primeiro ano do governo JK, por exemplo, o índice de participação da indústria no PIB era de 13,8%.

    Ao mesmo tempo em que a indústria perdia participação no PIB, crescia substancialmente o peso das commodities nas exportações brasileiras. Os dados da balança comercial são bastante significativos. A partir dos anos 1990, houve uma gradual e bem-vinda abertura da economia brasileira. Com isso, porém, cresceram muito as importações de manufaturados, enquanto as exportações desses itens perdiam espaço no comércio exterior do país, por falta de competitividade e eficiência. Juros elevados, em muitos anos os mais altos do mundo, energia cara, câmbio valorizado que facilita importações e dificulta exportações e a enorme carga tributária são fatores que contribuíram para reduzir a capacidade de competir da indústria do país.

    Em seu melhor ano, 1993, os manufaturados representaram 61% da pauta de exportações brasileiras. A partir daí, houve queda constante.
    No ano passado, mais recente dado consolidado disponível, as manufaturas responderam por apenas 38% da pauta. Enquanto isso, os produtos básicos, impulsionados principalmente pela venda de grãos e minérios, com um total de US$ 113 bilhões exportados em 2013, representaram 47% da pauta.

    Produzir quase 200 milhões de toneladas de grãos é, sem dúvida, uma virtude, decorrente da grande extensão territorial do país, da fertilidade do solo brasileiro e do trabalho de aprimoramento tecnológico na atividade agrícola. Porém, qualquer cartilha de economia vai mostrar que é mais benéfico para o país processar esses grãos, industrializá-los e exportar alimentos acabados, porque as margens são muito maiores e a geração de empregos nesse processo é muito mais intensa.

    O mesmo se aplica a outros produtos básicos, como minérios. Teoricamente, o país lucra mais ao exportar produtos com maior valor agregado, como aço, máquinas, automóveis e geladeiras, em vez de minério de ferro.

    A redução da participação da indústria na formação do PIB dos países, segundo muitos economistas, é um fator inerente à própria evolução da economia -quanto mais evoluída, mais ela se baseia em serviços demandados pela população com alto poder aquisitivo. Mas a desindustrialização e a volta do predomínio do setor primário estariam criando uma dependência muito alta da demanda internacional por commodities, especialmente da China, hoje um motor do crescimento mundial.

    Certamente a "reprimarização" não é a única razão do baixo crescimento -há outras, entre elas a forte tendência de adoção de medidas conservadoras na condução da política econômica.

    No momento em que o país fechou 2013 com o PIB crescendo apenas 2,3%, uma série de fatores conspira contra a eventual recuperação no curto prazo: os investimentos não devem manter o bom ritmo de expansão do ano passado (6,3% com base na Formação Bruta de Capital
    Fixo), até porque o BNDES, que sustenta cerca de 13% dos investimentos do país, já avisou que vai reduzir o desembolso de recursos.

    Além disso, há incertezas sobre o fornecimento de energia e sobre novas concessões de serviços públicos; o Banco Central espera um crescimento do crédito inferior aos 15% de 2013, já que a taxa básica de juros foi elevada para 10,75% e poderá subir para 11% dentro de um mês.

    Com esse coquetel de maldades anunciadas, é muito difícil que a economia volte a apresentar tão cedo um ritmo de crescimento virtuoso. Só por milagre.

    benjamin steinbruch

    É empresário, diretor-presidente da CSN, presidente do conselho de administração e 1º vice-presidente da Fiesp. Escreve às terças, a
    cada duas semanas.

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