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    Benjamin Steinbruch

    Reformas não podem esperar

    04/11/2014 02h00

    Reeleita para mais um período de quatro anos, a presidente Dilma Rousseff não precisa mesmo esperar a posse do segundo mandato para tomar algumas medidas de ajuste da economia.

    Uma parte dos problemas do país decorre da falta de confiança tanto dos consumidores para consumir quanto dos empresários para investir. Outra parte advém de restrições estruturais que impedem o crescimento sustentado da economia.

    Durante a acirrada campanha presidencial, disseminou-se uma grande dose de pessimismo sobre a economia brasileira. Pessimismo exagerado, todavia, não ajuda em nada. Afinal, apesar dos problemas, ainda são bons alguns fundamentos da economia.

    A dívida pública está elevada, mas em nível nada dissonante quando comparada com a de outros países em relação ao PIB (58%), e as reservas cambiais internacionais atingiram US$ 375 bilhões. A inflação está alta, mas não é alarmante. Nem de longe se pode imaginar um Brasil na situação em que várias vezes esteve nos anos 1980, quando foi obrigado a recorrer ao FMI para honrar seus compromissos financeiros.

    Desde logo observo que o ajuste necessário deve se distanciar da fórmula adotada pelo conservadorismo europeu, que elegeu a austeridade radical para enfrentar a crise.

    Seguidamente implementados, os cortes de gastos públicos foram cada vez mais empurrando os países para a recessão ou a estagnação, com aumento assustador do desemprego e o surgimento de um fantasma inverso da inflação, a deflação.

    Do outro lado do Atlântico, os EUA adotaram política menos ortodoxa, irrigaram a economia com recursos, cortaram rapidamente as taxas de juros e já saem da crise com crescimento de 3,5% e criação de empregos.

    Dito isso, pode-se acrescentar que a presidente deveria propor, o mais rápido possível, uma reforma fiscal, cujo principal objetivo seria reduzir a carga tributária e agregar competitividade à economia. Claro que cortes de gastos públicos serão necessários, mas nunca poderão atingir investimentos e a área social –os alvos devem ser despesas correntes da pesada estrutura governamental.

    O alívio fiscal tornaria ainda mais viável a redução das taxas de juros, uma das vergonhas brasileiras, sem provocar mais inflação. De surpresa e na contramão dos movimentos em outros países, o Banco Central elevou a taxa de juros para 11,25% ao ano na semana passada. Não há economia que consiga ser competitiva com essa taxa, enquanto o resto do mundo opera com juros negativos.

    O corte dos juros ajudaria a manter o câmbio desvalorizado, com apoio aos exportadores. O câmbio é um dos fatores responsáveis pelo encolhimento da indústria nacional nas últimas décadas e pela perda de espaço nas exportações. As vendas externas de manufaturados, que já atingiram no passado recente quase 60% das exportações brasileiras, variam hoje na faixa de 35% a 40%.

    Além disso, o desenvolvimento da indústria nacional precisa ser reorientado para a criação de uma estrutura produtiva mais avançada tecnologicamente e integrada nas cadeias globais. Isso vale tanto para investimentos nacionais como estrangeiros, que no longo prazo não podem olhar apenas para dentro do país, por mais importante que seja o mercado interno.

    Desde já, antes da posse, em 1º de janeiro, a presidente e as lideranças políticas de todos os partidos deveriam buscar um acordo sobre a reforma política –as primeiras discussões pós-eleição geraram mais trevas do que luz. A campanha eleitoral e as últimas revelações no campo da corrupção deixaram claro que a mudança é urgente.

    Será necessário reformular o sistema eleitoral, a forma de financiar as campanhas e repensar a reeleição. O tema da reeleição é controverso. Muitos argumentam que ela favorece a continuidade de planos de governo. Outros a consideram um perigoso estimulador da corrupção.

    Em coluna anterior, defendi aqui a necessidade de evitar o revanchismo após as eleições. Agora, com a decisão soberana dos brasileiros já manifestada nas urnas, essa ideia precisa ser reforçada. Não cabem revanchismos nem de eleitos nem de não eleitos. A obrigação de todos é respeitar a decisão popular, trabalhar e torcer pelo Brasil, que, mais do que nunca, tem pressa –as reformas não podem esperar.

    benjamin steinbruch

    É empresário, diretor-presidente da CSN, presidente do conselho de administração e 1º vice-presidente da Fiesp. Escreve às terças, a
    cada duas semanas.

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