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    Benjamin Steinbruch

    A era dos excessos

    17/11/2015 02h00

    É difícil escrever sobre qualquer assunto num momento em que o mundo assiste petrificado ao avanço da barbárie e chora pelas vítimas de Paris. Mas, colocando foco em problemas brasileiros, lembro inicialmente uma frase atribuída a Paracelso, médico e físico do século 16: "A diferença entre um veneno e um remédio está só na dosagem".

    O país precisa muito refletir sobre essa ideia, que está longe de se aplicar apenas à química e à medicina. Há um claro exagero em quase tudo no país: na polarização política, na ortodoxia econômica e monetária, nas críticas, no denuncismo e no pessimismo geral que deprime cada vez mais os brasileiros.

    Nada é mais deprimente, por exemplo, do que o nível das discussões que se desenrolam nas redes sociais. Pessoas xingam-se e acusam-se mutuamente por discordâncias ideológicas ou religiosas, sem nenhum receio de cometer crimes de calúnia, injúria e difamação. É preciso diminuir a dosagem desses atritos para um nível civilizado de discussão de convicções e ideias.

    Doses exageradas de crítica têm um nome: intolerância, atitude que, infelizmente, já saiu das redes sociais para a vida real. Todos vimos imagens lamentáveis do ex-ministro Guido Mantega, por exemplo, sendo hostilizado em restaurantes, chamado de muitas coisas ruins. Mantega foi ministro da Fazenda durante quase nove anos, teve momentos de acertos e erros, mas não é disso que se trata.

    Assistimos, durante a Copa do Mundo do ano passado, à presidente Dilma ser xingada por grupos de torcedores com uma frase-palavrão que não dá para transcrever. Dilma também é responsável por acertos e erros, mas não é disso que se trata. Trata-se de educação, civilidade, boas maneiras, respeito às diferenças e tolerância, coisas que estão em falta no atual momento brasileiro.

    O debate econômico está excessivamente radicalizado. Um exemplo: cansamos de ver, nos últimos anos, articulistas de todas as tendências defendendo a redução da carga tributária brasileira, em razão do pesado ônus que isso significa para o setor produtivo. Ou seja, as desonerações que beneficiaram vários segmentos da atividade eram necessárias e tinham apoio geral no país. Pode ter havido aqui também erro na dosagem, não no remédio. Mas não é porque existem problemas fiscais que vamos amaldiçoar as desonerações e jogá-las no fogo do inferno. O país ainda precisa reduzir sua carga tributária. Alguém discorda?

    Esses excessos fazem muito mal ao país. O pessimismo é insuflado de forma estridente nas manchetes de jornais, no rádio, na televisão e, com ódio e intolerância, no dia a dia dos debates das redes sociais. Se você manifesta uma opinião um pouco diferente, é hostilizado imediatamente.

    Aqueles que cometem excessos por razões políticas, unicamente pela disputa do poder, e que apostam no "quanto pior, melhor" deveriam saber que o resultado dessa disputa é o desemprego, a desagregação de famílias, o sofrimento de mães e crianças, o aumento da criminalidade, a insegurança e a desesperança geral no país.

    Acreditamos que a frase de Paracelso embute uma mensagem que se aplica perfeitamente ao Brasil de hoje. Todos temos a obrigação de dosar as críticas –para que elas sejam remédio e não veneno–, aceitar diferenças, evitar radicalismos e buscar entendimento.

    benjamin steinbruch

    É empresário, diretor-presidente da CSN, presidente do conselho de administração e 1º vice-presidente da Fiesp. Escreve às terças, a
    cada duas semanas.

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