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    Benjamin Steinbruch

    Desenvolvimento não cai do céu

    16/05/2017 02h00

    Silva Junior - 5.jul.13/Folhapress
    SERTAOZINHO, SP, BRASIL, 05-07-2013. Operarios na linha de montagem da industria de caldeira Caldema em Sertãozinho. A falta de projetos de novas usinas de açúcar e álcool causa reflexos nas empresas de máquinas e equipamentos em um dos principais polos do setor, em Sertãozinho. A ociosidade média nas fábricas chega a 60%, de acordo com cálculos do Ceise Br (centro nacional das indústrias do setor). Na Caldema, em 2013, houve apenas um pedido para fabricação de caldeira.( foto silva junior/folhapress ) REGIONAIS
    Operários caminham em linha de montagem de indústria de máquinas para usinas em Sertãozinho (SP)

    Falemos da indústria. Não se trata aqui de comparar a administração brasileira atual com anteriores.

    Trata-se de analisar o que está sendo proposto —ou está deixando de ser proposto— num momento em que a desindustrialização avança a passos de gigante e o neoliberalismo radical impõe a ideia de que a indústria brasileira deve ser entregue à sua própria sorte, sem ter as condições para competir em igualdade com os concorrentes internacionais.

    Pouco importa que a produção industrial geral tenha caído 3% em 2014, 8,3% em 2015 e 6,6% em 2016, totalizando um retrocesso de quase 17% em três anos.

    Pouco importa que a indústria de máquinas tenha perdido 50% de seu faturamento nesses mesmos três anos.

    Pouco importa que a indústria naval e a cadeia produtiva de petróleo e gás tenham sido praticamente destruídas.

    Pouco importa que o setor da indústria de transformação tenha cortado 323 mil empregos em 2016, e a da construção civil, 359 mil.

    Pouco importa que as exportações de manufaturados tenham caído de US$ 93 bilhões em 2013 para US$ 74 bilhões em 2016, com uma perda de receita em moeda forte para o país de cerca de US$ 50 bilhões em três anos.

    Pouco importa que a produção de veículos, de um setor que já foi o carro-chefe da economia brasileira, tenha caído para apenas 2,2 milhões de unidades no ano passado, fazendo o segmento industrial voltar para o seu nível de produção de 12 anos atrás.

    Pouco importa que o crédito esteja sendo sonegado, ainda que centenas de bilhões pudessem ser oferecidos às empresas pelo setor financeiro estatal e privado.

    Pouco importa que as taxas de juros se mantenham no mais absurdo nível quando comparadas com as internacionais, o que inviabiliza qualquer iniciativa financiada e envergonha o país.

    Li há duas semanas, nesta Folha, uma entrevista do presidente do conselho da Abimaq, João Carlos Marchesan, associação que reúne os fabricantes de máquinas e equipamentos, à repórter Raquel Landim.

    Ele observou que o governo, ainda que tenha um comportamento corajoso para impor as reformas de que o país precisa, tem um "cunho ideológico" liberal e "não olha para a indústria com a devida atenção".

    Esse "cunho ideológico", na verdade, é um desastre para o país.

    Fundamenta-se no pressuposto ingênuo de que o mercado regula tudo e que a indústria brasileira pode competir com os concorrentes internacionais em igualdade de condições, quando, na verdade, é assolada por uma série de desigualdades, como o custo do capital astronômico, a tributação excessiva, o custo incerto da energia e a burocracia infernal.

    Sem tirar esses "penduricalhos" (palavra usada por Marchesan), expor a indústria à competição internacional é o mesmo que, digo eu, jogá-la na cova dos leões.

    Ouvi recentemente o psiquiatra e psicanalista Jorge Forbes dizer que, na sociedade atual, o medo virou virtude. Temos medo de tudo, de lactose, sacarose, glúten, gorduras, sódio etc. Eu acrescentaria que temos medo de financiar empreendimentos, de estabelecer prioridades, de lançar políticas setoriais, de planejar o desenvolvimento.

    Não pode ser assim. Desenvolvimento não cai do céu. Medo é atraso, negação, retranca. Virtude é coragem, ousadia, empreendedorismo, inovação.

    benjamin steinbruch

    É empresário, diretor-presidente da CSN, presidente do conselho de administração e 1º vice-presidente da Fiesp. Escreve às terças, a
    cada duas semanas.

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