• Colunistas

    Monday, 06-May-2024 11:12:11 -03
    Bernardo Mello Franco

    Vinte anos sem Darcy

    19/02/2017 02h00

    Luciana Whitaker - 12.dez.1995/Folhapress
    ORG XMIT: 555401_0.tif Darcy Ribeiro, antropólogo e senador. (Rio de Janeiro, RJ, 12.12.1995. Foto de Luciana Whitaker/Folhapress)
    Darcy Ribeiro, em foto de 1995

    BRASÍLIA - "Se os governadores não construírem escolas, em 20 anos faltará dinheiro para construir presídios". A frase de Darcy Ribeiro voltou a ser lembrada no mês passado, quando o país viveu uma onda de massacres nas cadeias. Foi profetizada em 1982, quando o antropólogo se elegeu vice-governador do Rio na chapa de Leonel Brizola.

    Muitos políticos usam a educação para fazer demagogia barata. Não era o caso de Darcy. Ele idealizou e construiu centenas de Cieps, escolas públicas de tempo integral. Ergueu duas universidades, incluindo a de Brasília, da qual foi o primeiro reitor.

    Não deixou de ser chamado de professor nem quando chefiou a Casa Civil, no governo João Goulart. Em 1964, tentou liderar uma resistência brancaleônica ao golpe. Deixou o Planalto quando os militares já ocupavam o gabinete presidencial, de onde só sairiam 21 anos depois. "Aquela era minha hora de chumbo. Hora que eu preferia estar morto a sofrê-la: a hora do derrotado", conta, em suas memórias.

    Darcy dizia ver duas opções na vida: se resignar ou se indignar. Escolheu a segunda, e culpava a indiferença da elite pelo atraso do país. "O Brasil tem um bolsão de gente que vem da escravidão, oprimido, marginalizado. Enquanto não incorporar este bolsão, o Brasil não existirá como gente civilizada", avisava.

    O professor não se conformou nem com a doença. No fim da vida, arranjou uma cadeira de rodas e fugiu do hospital onde tratava um câncer. Queria voltar para sua casa de praia e terminar "O povo brasileiro", um tratado ambicioso sobre a mistura de raças que formou o país.

    Com falsa modéstia, ele dizia que sua aventura não deu certo. "Tentei alfabetizar as crianças brasileiras, não consegui. Tentei salvar os índios, não consegui. Tentei fazer uma universidade séria e fracassei. Mas os fracassos são minhas vitórias. Eu detestaria estar no lugar de quem me venceu". Na sexta-feira (17), o Brasil completou 20 anos sem Darcy.

    bernardo mello franco

    Jornalista, assina a coluna Brasília. Na Folha, foi correspondente em Londres e editor interino do 'Painel'.

    Edição impressa

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024