RIO DE JANEIRO - Não adianta me oferecerem de graça a Capela Sistina, o Taj Mahal, o Louvre inteiro (sem aquela pirâmide de vidro que botaram em frente do museu), as joias da rainha da Inglaterra, o que sobrou da fortuna do Eike Batista, as chuteiras do Messi e duas ou três mulheres que entraram na minha cobiça desvairada. Mesmo assim, não seria capaz de fazer uma laranja. Contudo, ainda que nada me deem, posso dizer que determinada laranja está podre.
O introito desta crônica serviria para qualquer assunto ou comentário, é um respeitável nariz de cera grudado numa cara de pau como a minha, dando crédito a uma amiga que assim me definiu e eu nem pude contestar.
Não tenho nenhum motivo para classificar nenhuma laranja como podre, mas me julgo com direito a afirmar que a democracia representativa, tal como a nossa, está com prazo de validade vencido.
Já comentei a palestra que Fernando Henrique Cardoso fez na Academia Brasileira de Letras, recentemente, sobre a necessidade de "reinventar a democracia". Sobretudo a democracia representativa, tal como a nossa, que pariu (ou ajudou a parir) a corrupção que mais do que nunca nos maltrata e envergonha.
Não tenho a veleidade de oferecer à pátria uma alternativa, mas considero que o Brasil tem talentos que poderiam, isolada ou coletivamente, propor um outro ritual, que não seja a ditadura, para "representar o povo", do qual deve surgir um novo tipo de representação que não dependa do poder econômico e financeiro, que –este sim– representa (e como!) os interesses do capital e avilta o trabalho.
Como dizem os oradores de sobremesa ou de sepultamento, "falece-me" autoridade para propor uma nova forma de consultar o povo, do qual todo poder emana.
É membro da ABL. Começou sua carreira no jornalismo em 1952 no 'Jornal do Brasil'. É autor de 17 romances e diversas adaptações de clássicos.