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    Carlos Heitor Cony

    A volta por cima

    14/07/2015 02h00

    RIO DE JANEIRO - Não se trata de humildade e orgulho: não tenho autoridade nem vontade para dar recados ou conselhos a ninguém, sobretudo a mim mesmo, sobretudo à presidente, dona Dilma.

    Apenas me lembrei de um colega de Redação que cobria artes plásticas e era catedrático da Faculdade de Arquitetura. Quase todos os dias era procurado por pintores, donos de galeria, gente da fauna que pedia notas ou sugeria pautas para sua coluna.

    Até que perdeu a paciência e botou em sua mesa uma advertência em letras garrafais: "Desconfie, cara, você não está agradando, saia de mansinho e não volte". Era filho de um senador, pessoa de fino trato, respeitadíssimo em sua área, um elogio dele era uma consagração.

    Lendo jornais e revistas, ouvindo o que se diz nas ruas, e citando mais uma vez Nelson Rodrigues, o que se rosna nas "ruas, botecos e velórios", suspeito que cada brasileiro podia colocar na testa o mesmo recado. "Dona Dilma: desconfie que não está agradando". Nem à sua base aliada, e muito menos à sua base não aliada. Afinal, qual foi a infâmia que fizemos para ganhar uma presidente que prometeu tanto azeite e está nos dando um amargo vinagre?

    Sempre que pode, e mesmo quando não pode, ela reclama que não está sendo compreendida. Somente a "perduta gente", à qual Dante se referiu na porta do inferno, além de não compreendê-la, murmura ou grita que seu governo não está agradando, que ela deve sair de mansinho, sem a necessidade de um "impeachment" ou de um golpe que complicará ainda mais a já complicadíssima situação do país, mergulhado na corrupção e ameaçado de inflação.

    Não é caso para a presidente sair de mansinho. Ou com espalhafato. Talvez nem precise sair. Basta aceitar que precisa mudar a situação do país e dela própria. Com os anos de poder que ainda tem pela frente, ela é capaz de dar a volta por cima.

    carlos heitor cony

    Escreveu até dezembro de 2017
    carlos heitor cony

    É membro da ABL. Começou sua carreira no jornalismo em 1952 no 'Jornal do Brasil'. É autor de 17 romances e diversas adaptações de clássicos.

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