• Colunistas

    Monday, 29-Apr-2024 07:37:00 -03
    Carlos Heitor Cony

    Pesquisa de opinião

    02/04/2017 02h00

    Reprodução
    O ditador italiano Benito Mussolini (à esq.) é retratado por um artista, em foto de data desconhecida

    Em Fontamara, no alto do morro da região mais miserável da Itália, o governo fascista de Mussolini mandou uma comissão do partido fazer uma espécie de plebiscito entre os "cafoni" (camponeses) para saber o que eles pensavam politicamente.

    O líder dos fascistas perguntou ao sapateiro: "Viva quem?". A resposta foi respeitosa: "Viva a rainha Margarida!"; "A rainha Margarida já morreu". O mesmo inquisidor escreveu ao lado: "alienado". O segundo a ser interrogado respondeu: "Abaixo os ladrões". Foi classificado como anarquista. O terceiro não sabia dizer "vivas". Só sabia dizer "abaixo" e respondeu: "Abaixo os impostos". Também foi classificado como anarquista.

    O "cafone" seguinte foi Rafael Scarpone, que gritou: "Abaixo os bancos". Foi classificado como comunista. Um outro gritou de mãos postas: "Viva a Virgem de Loreto". Um outro discordou. Mas foi contestado, alguém reclamou: "Viva São Roque". Foi anotado como clerical. O sacristão preferiu dar o viva ao "pão e ao vinho".

    Della Croce, alfaiate, considerado um homem prudente e sábio, percebendo que nenhuma das respostas satisfazia a comissão de fascistas, subindo num caixote, proclamou: "Vivam todos!". O chefe dos fascistas mandou anotar: "liberal".

    Uliva berrou com emoção: "Viva o governo!". "Qual governo?", perguntaram. "O governo legítimo." Foi definido como "patriota". Em seguida, o lavrador Sexta-Feira Santa respondeu: "O governo ilegítimo". Foi anotado como "subversivo perigoso".

    A comissão de fascistas voltou para Roma e fez um relatório sobre Fontamara: "Com jeitinho e óleo de rícino, pode ser aproveitada". Quiseram saber a quem o vigário dera o viva. O vigário não foi encontrado, estava na casa de Gina, a prostituta mais famosa de Fontamara.

    carlos heitor cony

    Escreveu até dezembro de 2017
    carlos heitor cony

    É membro da ABL. Começou sua carreira no jornalismo em 1952 no 'Jornal do Brasil'. É autor de 17 romances e diversas adaptações de clássicos.

    Edição impressa

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024