• Colunistas

    Wednesday, 15-May-2024 11:58:50 -03
    Caro Dinheiro - Samy Dana

    O medo faz você consumir mais do que o desejo de ser feliz

    24/08/2015 02h00

    Você já deve ter ouvido por aí a expressão "família de comercial de margarina". A designação resume bem o estereótipo que a propaganda cria: uma família perfeita, um cachorro de raça ao lado da mesa, todos felizes com um dia ensolarado e uma casa bonita. Cena que retrata uma felicidade nem sempre condizente com a realidade.

    "Vender felicidade" é uma das estratégias da publicidade, mas outros fatores são importantes e decisivos em nosso impulso para consumir. O medo é um dos mais comuns.

    Um dos primeiros produtos a seguir esse tipo de raciocínio para ser vendido foi o antisséptico bucal Listerine.

    A propaganda criava uma ansiedade no público quanto a um risco iminente: uma mulher com um belo sorriso, mas que tinha dificuldade para se relacionar com os outros porque sofria de halitose.

    Os comerciais seguintes seguiam a mesma linha, fazendo questão de enfatizar que a halitose poderia afetar qualquer um e que pessoas próximas ficariam constrangidas para alertar para o problema. O desfecho: Listerine como "solução milagrosa".

    O exemplo do antisséptico é mencionado na segunda parte do documentário britânico "The Men Who Made us Spend", produzido pela BBC. A ideia do comercial surgiu de Stanley Wrestle, um dos primeiros a usar a estratégia de explorar as motivações humanas para gerar consumo.

    Os reflexos disso continuam sendo replicados até hoje. É possível pensar em uma enorme gama de produtos que são consumidos porque previamente foi gerada uma ansiedade, uma necessidade de consumo para se sentir seguro ou protegido.

    Na indústria farmacêutica, de cosméticos e saúde essa técnica fica mais evidente.

    Isso explica, por exemplo, o motivo dos tais sucos Detox terem se transformado em febre nacional, mesmo sem prova científica de efeitos benéficos. Se o comercial de sabonete for feito focando na quantidade de bactérias às quais estamos expostos, é possível que você fique mais propenso a comprar um antibacteriano do que um sabonete comum, ainda que os médicos considerem isso desnecessário e até prejudicial.

    Cosméticos e tratamentos estéticos inflam os lucros a cada ano, alimentados pelo medo que as pessoas têm de envelhecer.

    Os medos gerados pelos comerciais ficam incutidos em nosso subconsciente. Quando for às compras, alimente o hábito de se questionar com mais frequência. Analise se você realmente precisa daquilo ou se é apenas a persuasão da ansiedade e do medo que estão levando ao consumo.

    caro dinheiro

    Escreveu até novembro de 2015

    por samy dana

    Ph.D em Business, doutorado em administração, mestrado e bacharelado em economia. É professor na Escola de Administração de Empresas de São Paulo da FGV.

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024