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    Caro Dinheiro - Samy Dana

    O que pensar sobre a credibilidade de quem classifica o risco de países?

    27/09/2015 02h00

    Uma notícia que envolvesse o nome de agências de classificação de risco divulgada há dois anos talvez não despertasse grande interesse da população. Neste período de crise, no entanto, quando as três principais agências de rating do mundo começaram a sinalizar que estavam perdendo a confiança na capacidade de o Brasil honrar seus compromissos financeiros, começava ali uma faísca que poderia virar um grande incêndio.

    O combustível de verdade veio com a decisão de uma delas, Standard & Poor's, de retirar o selo de bom pagador do Brasil, concedido em 2008.

    De fato, o país teve condições de "ostentar" o título de grau de investimento por menos de oito anos (2008-2015). É como entregar um presente de aniversário a uma criança e tomá-lo de volta antes mesmo que ela apague as velas do bolo.

    As medidas anunciadas recentemente pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, visando cortar gastos e mudar as perspectivas para o orçamento de 2016 se justificam pelo que representa a decisão da S&P.

    Matéria da Folha mostra a diferença da entrada de recursos estrangeiros no país antes e depois do selo de bom pagador. Segundo informações do Banco Central e do Tesouro Nacional, de 2002 a 2007 o Brasil recebeu, em média, um fluxo anual de US$ 19 bilhões.

    De 2008 a 2014, esses números deram um salto significativo, passando para US$ 54 bilhões anuais, em média. O volume praticamente triplicou. O grande receio do governo, neste momento, é que o país retorne aos patamares observados no período anterior a 2008.

    Bom, até então sabemos que é realmente lastimável que o país não tenha desfrutado do título de bom pagador por mais tempo. Por outro lado, existem aspectos que não podem deixar de ser considerados quando pensamos na questão da classificação de risco. E para isso é preciso analisar duas questões de forma individual.

    Do lado de cá, não há como contestar que a política econômica adotada nos últimos anos teve efeitos catastróficos. Se em 2008 nos alegrávamos pelo fato de o Brasil ter conseguido escapar de impactos mais dolorosos da crise imobiliária americana, a propaganda política nos anos seguintes dava a entender que as coisas continuavam indo bem.

    Mas a disparada da inflação, dos juros, o crescimento do desemprego e a desaceleração da economia mostraram que a conta não estava fechando como deveria.

    Bom, se para nós está bem claro que não faltam motivos para contestar a falta de credibilidade na gestão atual, o que dizer a respeito da reputação das agências responsáveis pela classificação de risco? Em meio a todo alvoroço gerado em função do rebaixamento do Brasil pela S&P, um fato crítico que não veio à tona com a atenção que merecia é a função que a mesma agência exerceu durante a crise imobiliária dos Estados Unidos.

    Uma comissão de inquérito aberta naquele país em 2011, com o objetivo de investigar a crise, apurou que as agências de rating tiveram papel decisivo no agravamento do colapso financeiro. Empresas hipotecárias que já estavam com dificuldades financeiras ou mesmo à beira de quebrarem recebiam notas de crédito altas.

    A situação só cessou em meados de 2007, quando a crise já havia chegado ao seu ápice. As mesmas empresas que vinham recebendo notas altíssimas de repente despencaram na classificação de risco e o mercado entrou em pânico.

    Se por aqui o governo precisa mostrar que os esforços são capazes de recuperar nosso selo de investimento e a manutenção de investidores de longo prazo, do lado de lá só nos resta esperar que a conduta das agências não seja questionável como foi na crise americana.

    caro dinheiro

    Escreveu até novembro de 2015

    por samy dana

    Ph.D em Business, doutorado em administração, mestrado e bacharelado em economia. É professor na Escola de Administração de Empresas de São Paulo da FGV.

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